segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Profecias para 2013. Será um ano pior do que 2012? Por Solano Portela


Esta é a época em que os profetas de plantão saem das tocas. Quando eu era jovem os astrólogos dominavam a cena. Omar Cardoso era uma celebridade nacional[1] no meio de uma constelação meio obscura de personalidades que pontificavam as previsões para o ano seguinte. Estes escreviam também, religiosa e mercenariamente, em todos os sentidos, as inúteis colunas de horóscopos, de ávida leitura obrigatória em todos os jornais e revistas.

Não sei muito bem o que aconteceu, mas eles saíram um pouco de cena. Sei que ainda estão presentes e muitos os seguem, mas não têm a mesma notoriedade ou repercussão do passado. O país ficou mais cético? Talvez. É possível, também, que a prática de algumas revistas, de compararem as previsões com as realizações, contribuiu para um descrédito maior destes futurólogos, ainda que as Ana Maria Bragas da vida continuem a promovê-los, junto com numerólogos, grafólogos e outras sandices do gênero.

Suspeito, entretanto, que com a multidão de apóstolos, reis, vice-deuses, operadores de maravilhas e propagadores de prosperidade, que pululam o nosso mundo evangélico uma classe esteja substituindo a outra. Acho que muitos líderes evangélicos pensaram: “por que deixar o monopólio das predições só para eles? Vamos pegar uma fatia desse interesse”. Afinal estamos na era dos sete passos para isso, dez degraus para aquilo, cinco princípios para a prosperidade total, e por aí vai. O fato é que não há carência de profecia, nesta terra, ainda que de evidente procedência humana. E nesse campo, a credulidade é espantosa – muitos continuam ansiosos para saber o que vai acontecer no mundo, no país e em suas vidas.

Bom, aqui no Tempora, vou fugir um pouco da nossa linha reflexivo-crítica e, para não ficar de fora da onda do momento, farei dez previsões para 2013. Podem me responsabilizar por elas, mas deem uma trégua até dezembro do ano que vem, pelo menos.

O que vai acontecer, então, em 2013?

1. A corrupção vai continuar. Ou vocês acham que ela acabou com o julgamento do mensalão? Os escândalos continuarão aflorando, ainda que a chamada “sociedade” esteja mais antenada e a imprensa gostando do aumento de circulação que essas notícias propiciam. Vemos apenas um pedacinho do iceberg e a parte submersa é mais volumosa, destrutiva e letal. Para os cristãos, isso não deveria ser surpresa, pois a corrupção está enraizada no coração das pessoas – até no daquelas que criticam os corruptos públicos, ou pegos com a mão na botija. Jeremias 17.9 diz: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá”?

2. Os preços vão aumentar. Ainda que se propague que a inflação está “sob controle”, os indicadores registram aumentos incompatíveis com uma economia estável e os preços dos serviços aumentam acima deles. O dólar continua subindo e algumas vozes iluminadas no governo defendem um patamar de R$2,40 – insensíveis à dependência que os demais preços possuem do relacionamento cambial. Sobe o dólar e tudo fica mais caro e mais difícil. A voracidade de taxação do governo está também sempre presente e chegam a ser cômicas, se não fossem trágicas, as “soluções” estatais para controlar os preços: aumenta-se a alíquota do IPI (como no caso dos automóveis chineses) e depois dá-se um desconto, por decreto, por um tempo. Enfim, nada mudou no governo desde o tempo em que o povo de Israel clamava por um Rei e foi avisado pelo profeta Samuel que não se esquecesse de que a máquina governamental iria sugar milhões para se sustentar, pela opressão fiscal. Em 2013, o governo continuará voraz e todos nós pagaremos uma conta cada vez maior. A realeza do Real está cada vez mais diluída, relembrando Isaías 1.22: “A tua prata se tornou em escórias”.

3. A vida vai permanecer difícil com tribulações, enfermidades, injustiças.Cresce a expectativa de vida, avança a medicina, organiza-se o poder judiciário, mas as agruras desta vida, consequência genérica do pecado (nem sempre específica, na vida dos que sofrem) são realidade incontestável. “No mundo passais por aflições”, já alertava Jesus (João 16.33). A criação “geme e suporta angústias até agora” ansiando pela “redenção”, ensina Paulo (Romanos 8.22 e 23). Assim desconfie daqueles que prometem a tranquilidade e saúde aqui na terra. Isso não vai ocorrer em 2013.

4. A violência não vai dar muita trégua. Vivemos em uma era onde os governantes acham que têm direitos (e não, necessariamente, responsabilidades) sobre tudo e a necessidade de exercer o controle sobre todos. Na prática, os governantes terminam fazendo pouco e mal. Esquecem-se da responsabilidade primordial (Rom 13.1-7), que a de serem “vingadores” dos inocentes e garantir a segurança dos seus cidadãos. Os cristãos não deveriam promover (e nem confiar em) um estado messiânico, na esperança de que todos os seus problemas serão supridos por um poder terreno, falível e temporal. Enquanto estimulamos os governantes a se ocuparem de tudo (ou não os desestimulamos de fazer isso), eles descuidam da segurança. Em 2012 ficou evidente que o governo não se ocupou adequadamente nem conseguiu garantir a vida de seus próprios integrantes, haja visto as inúmeras execuções sofridas pela força policial de vários estados, quanto mais a nossa! As perspectivas para 2013 não são nada animadoras, em um país onde ocorrem mais de 50 mil assassinatos por ano, a maioria dos quais sem qualquer punição. Uma situação para pensarmos cada vez mais na paz real, que vem de Jesus (João 14.27) – “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize”.

5. Os engarrafamentos vão piorar – Em São Paulo existe um veículo para cada dois habitantes. A cada dia cerca de 500 veículos novos começam a circular em suas vias. Nas grandes capitais a média diária de veículos novos que adentram as ruas é quase essa, pois a proporção por habitante é ainda menor. Em minhas viagens já vi que engarrafamentos, que eram uma característica típica de São Paulo, há algumas décadas, já são uma constante no Rio, Recife, Brasília, Aracajú, Porto Alegre e tantas outras grandes cidades do nosso país. Está cada vez mais difícil se locomover e a cada dia é mais importante morar perto da escola ou do trabalho. Alguns companheiros mais ousados deixaram os carros para trás e recorreram às motos, para o transporte diário: que estes sejam alvo de redobradas orações! Nessa situação é preciso o desenvolvimento crescente da virtude da paciência, bem como o exercício da criatividade, para que a hora perdida no trânsito seja ganha de alguma maneira. Que tal uma resolução para 2013, de se ouvir a Palavra, ou um “podcast” que edifique? Pense no Salmo 119.48: “...  levantarei as mãos e meditarei nos teus decretos”, mas conserve as mãos no volante!

6. Os vendedores de felicidade “aqui e agora”, o engano do evangelho da prosperidade vai permanecer. Alguém poderia fazer o prognóstico que a farsa mercantilista da “felicidade já” terá vida curta, pois, pragmaticamente, as pessoas constatarão a falsidade das promessas. Mas parece não haver limite ao desejo das pessoas de ouvirem coisas agradáveis sobre os seus dias futuros, principalmente se há apelo às recompensas materiais. Em paralelo, esse tipo de mensagem traz muito lucro aos proponentes, O curioso apelo de que “não deixe esse programa sair do ar” (para que possa continuar transmitido a pedir mais e a vender mais), continuará em 2013. Personalidades do campo evangélico que, no passado, rejeitaram essa fórmula claramente pagã continuarão a ser cooptados por ela, desviando o foco das verdadeiras necessidades das pessoas, como identificou apropriadamente Cristo, no caso da Mulher Samaritana (João 4.13-14) – a “água viva” que mata a sede para sempre. Em 2013, espere a continuidade da parada televisiva diária, e das grandes cruzadas dos propagadores de felicidade: mensagens terrenas, com linguajar evangélico.

7. As teologias e explicações humanas aos fenômenos da natureza permanecerão pródigas, no ministério de alguns. A virada do ano (2012-2013) trouxe um filme – “O Impossível” – que poderosamente nos relembrou dos acontecimentos do Natal de 2004, quando um Tsunami devastou a vida de quase 300 mil pessoas nas costas da Indonésia e Tailândia, bem como de outros países e ilhas circunvizinhas. Ainda que as imagens do Tsunami de 2011, no Japão, sejam mais poderosas, a tragédia de 2004 se constitui uma das mais perturbadoras na história da humanidade. Mas isso nos lembra, também, os teólogos relacionais (ou da teologia do processo), que retiram de Deus qualquer poder sobre as questões futuras. Para essas e outras tragédias, recorreram a explicações simplistas e naturalistas, dizendo que “Deus não tem nada com isso”, contrariando as afirmações bíblicas de que ele é Senhor Soberano sobre toda a criação, inclusive sobre as forças “da natureza”. Em 2013, esses teólogos continuarão fazendo estragos e desviando a muitos; procurando aquietar a própria perplexidade perante essas situações, preferem recorrer aos devaneios da mente, em vez de se renderem às afirmações da Palavra inspirada de Deus (Salmo 29.3; Isaías 29.6; Jonas 1.4).

8. As igrejas irão buscar mais e mais formas de entretenimento; as mensagens ficarão mais curtas; os caminhos da graça, mas distantes da Palavra. Agora que a chamada grande mídia, com os olhos na lucratividade do segmento, abraçou com todas as honras o segmento gospel; nestes tempos em que a adoração dá lugar às celebridades e à chamada “celebração”; nestes momentos em que se diluem os limites entre o espetáculo e o culto devido ao Senhor; devemos esperar uma intensificação do entretenimento nas igrejas, como se fosse apenas uma maneira mais contemporânea de cultuar. Preparem os ouvidos. Coloquem os óculos escuros. Tragam os decibelímetros. O volume vai aumentar. As coreografias vão se expandir. A prosseguir a tendência, as igrejas vão gastar mais dinheiro na iluminação e nos efeitos do que na parafernália eletrônica de amplificação. E o que vai ser sacrificado? A pregação, é claro! Está cada vez mais fora de moda, ainda que Deus especifique, em sua Palavra, que é o método determinado por ele para a propagação de suas verdades (Romanos 10.13-15). Ela vai sendo encurtada e a congregação “entregue” ao pregador depois de exaurida física e emocionalmente durante uma hora e meia, para uns minutos finais, como se fosse só para desencargo de consciência. Adentramos, assim, a zona perigosa de manifestações cúlticas de grande intensidade, mas que desagradam a Deus; onde a verdadeira adoração está ausente, como nos tempos de Amós (5.23 e 6.5), onde havia abundante louvor e transbordante música instrumental: “Afasta de mim o estrépito dos teus cânticos, porque não ouvirei as melodias das tuas liras”. Deus fala contra os que cantavam “à toa ao som da lira”, pois era tudo centralizado na auto-gratificação e entretenimento: diz o profeta que a intenção não era o louvor a Deus, pois inventavam “instrumentos musicais para vós mesmos”. E há, ainda, os que procuram se dissociar dessa corrente, mas apontam caminhos da graça estranhos aos da Palavra de Deus e à graça das Escrituras; com palavras que se alternam entre a virulência e a aparente piedade, mas que patinam entre a acomodação e encorajamento de formas comportamentais e sociais condenadas na Bíblia. A julgar pelo crescente número de seguidores e defensores, 2013 certamente será um ano “de arromba”, para esses segmentos do evangelicalismo contemporâneo.

9. A ira inconsequente e difamações de alguns profetas do caos, dentro do campo evangélico, permanecerão sendo lançadas contra servos fiéis. Virou moda, para alguns expoentes no campo evangélico, voltar os canhões da agressão contra servos fiéis, propagadores da palavra de salvação, defensores da teologia da reforma, difamando-os como “mundanos”, inconsequentes, protetores dessa ou daquela corrente – simplesmente por não compartilharem com a metodologia e mensagem agressiva abrigada por esses vasos de ira. 2013 não dá mostras de que esse recurso destinado à manutenção dessas figuras controvertidas no ápice da notoriedade, pela controvérsia, vai desaparecer, ainda que os tiros costumem sair pela culatra. Esses profetas do caos continuarão disparando antes de examinar; exibindo uma suposta coragem, que acomoda, na realidade, uma covardia de métodos e ausência de princípios; preferindo alianças políticas, e pseudo-espirituais, espúrias à verdadeira comunhão dos santos. Em 2013, não nos esqueçamos de Tito 3.10: “Evita o homem faccioso, depois de admoestá-lo primeira e segunda vez”. Evitemos aqueles que não se importam com as advertências de Tiago (3.14): “Se... tendes em vosso coração inveja amargurada e sentimento faccioso, nem vos glorieis disso, nem mintais contra a verdade”.

10. No entanto – no meio das perturbações e confusões deste mundo, em 2013, a graça de Deus continuará a ser manifestada – até que Ele cumpra os seus propósitos em sua criação. Não; nem tudo é sombrio no horizonte próximo, ou tem teor negativo. Podemos identificar os seguintes sinais encorajadores e positivos na igreja de Cristo, para o ano de 2013:

a. Renascimento de um interesse saudável pela sã doutrina: creio que nunca houve tanto interesse pelo estudo sério da Palavra de Deus e das doutrinas cardeais da fé cristã; dos pilares redescobertos pela Reforma do Século 16, do que nos dias de hoje. Não me refiro a números espetaculares, mas a um segmento firme, interessado e fiel, que tem abordado a Palavra de Deus com seriedade. Esse grupo surge em várias denominações e nele encontramos inúmeros JOVENS! Uma juventude que dialoga, se reúne e pesquisa a Bíblia; que emprega tempo em evangelização; que se preocupa em agradar a Deus e em tomar conta de suas vidas, além da doutrina, como nos instrui Paulo (1 Timóteo 4.16). As palavras de 1 João 2.14 soam muito bem para 2013, pois creio que essa tendência continuará crescendo: “Jovens, eu vos escrevi, porque sois fortes, e a palavra de Deus permanece em vós, e tendes vencido o Maligno”.

b. Pais criando os filhos – cerrando as trincheiras da família: O ataque institucional contra a família vem levando muitos pais a reconhecerem a necessidade de se empenhar mais, de lutar, de se envolver com mais intensidade na defesa da família. Em 2013 creio que veremos cada vez mais pais conscientes dessas responsabilidades. Incrivelmente, até entre pais descrentes encontramos aqueles que querem algo diferente para seus filhos.

c. Testemunho dos cristãos na sociedade – contra aborto e a dissolução sexual. Em paralelo ao fortalecimento da família, pelos cristãos, o mundo evangélico toma consciência de que, como cidadãos, precisam dar um testemunho mais intenso e eloquente. A sociedade já abriga o divórcio automático; já há a aceitação tácita do aborto, a caminho da legalização geral; e a instituição do casamento está sendo redefinida, já não mais se segue a definição bíblica (e constitucional) de união entre um homem e uma mulher, mas as portas estão escancaradas para a legalização e aceitação, como natural, do casamento homossexual. Em 2013 a voz dos cristãos continuará ressoando, ainda que eu tenha convicção de que esse é o grande teste para a Igreja – quando legalizarem algo claramente contrário à Palavra, quantas terão coragem de se manter fiel às diretrizes divinas?

d. Escolas Cristãs – Já há algumas décadas a multiplicação de escolas cristãs vem ocorrendo. Pedagogos cristãos vêm reconhecendo a necessidade de abordar o campo educacional sob uma cosmovisão cristã. 2013 verá um aumento desses esforços e a multiplicação de materiais didáticos abordando todas as áreas de conhecimento com premissas cristãs. Creio que a influência, nessa esfera, não somente cruzará linhas denominacionais, como transcenderá o campo evangélico em futuro próximo, pela qualidade do material e dos pedagogos envolvidos nesses programas.

e. Mídia social e Internet como meio de evangelização e instrução – A internet, considerada por muitos como uma maldição, pode sim ser instrumento de bênçãos e de evangelização. Em 2013 as redes sociais serão utilizadas com mais objetividade e de maneira mais abrangente, especialmente pelos jovens. Uma pessoa pode alcançar muitas, se fizer com jeito, cuidado e competência. Uma mensagem pode atingir repercussões positivas inesperadas. O cuidado a ser tomado, é o de não considerar esse tipo de relacionamento como substituto das interações pessoais, pessoa a pessoa; nem como substituto da pregação, como já observamos.

f. Mais e melhor literatura cristã de boa qualidade. Pela graça de Deus, mesmo no mar de publicações inconsequentes, muitos livros cristãos bons têm sido publicados, divulgados e adquiridos. Editoras sérias e fiéis têm se mantido sustentáveis. Conferências de porte têm sido realizadas, divulgando essas publicações e autores internacionais. Autores brasileiros têm surgido, alguns com repercussão internacional. 2013 verá a expansão dessas publicações e suas atividades correlatas.

g. A graça comum possibilitará freio a muita criminalidade, pela exposição dos praticantes – quando parece que o pecado “corre solto”, Deus, em sua misericórdia pela sociedade providencia exposição para que muitos vejam que esses delinquentes não são invisíveis. Por vezes nos surpreendemos com a graça divina que distribui a bênçãos a todos, mas a Bíblia diz (Mateus 5.45) que Deus “faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos”. É ele, também, que restringe o pecado, para que os seus propósitos sejam cumpridos. Devemos ser mais perceptíveis dessa graça comum, e, em 2013, agradecer continuadamente a Deus, pois é ela que possibilita, também, a nossa existência em um mundo tenebroso.

São essas minhas profecias para 2013. Sem horóscopo, sem mágicas, sem revelações espúrias; apenas observando o contexto e o mundo em que vivemos, e a forma como estamos sendo sustentados pela verdadeira graça divina. É esse poder de Deus que entrelaça os fios de nossas vidas em uma maravilhosa obra de arte, como já observou Edith Schaeffer em seu livro The Tapestry.[2] Feliz 2013 a todos os nossos leitores, da parte dos três que interagem com vocês, neste Blog.

FIM

Com essa última postagem, chegamos ao fim de 2012!
A nossa gratidão ao nosso bondoso Deus e Pai de misericórdia, e a vocês que estiveram visitando o blog da IECCM.
Um forte abraço do Pr. J Miranda a todos os irmãos e amigos.

Feliz 2013!!

domingo, 30 de dezembro de 2012

A impotência da vontade humana - Por A. W. Pink



Será que encontramos na vontade do homem, competência para aceitar ou rejeitar o Senhor Jesus como Salvador?

Admitindo-se que o Evangelho é pregado ao pecador, que o Espírito Santo o convence de sua condição perdida, não é, em última análise, encontrar poder dentro de sua própria vontade para resistir ou se entregar a Deus?

A resposta a essa pergunta define nossa concepção da depravação humana.

Todo cristão professo dirá que o homem é uma criatura caída, mas o que o termo “caído” quer dizer a muito deles, isso será difícil de determinar.

A impressão geral é de que o homem é agora mortal, que ele não está mais no estado em que estava nas mãos do criador, que ele tem tendências más, mas que, se ele empregar seus poderes para o melhor de si, de alguma forma ele vai ser feliz depois.

Ó, quão longe e triste da verdade! Enfermidades, doenças, até mesmo a morte corporal, são ninharias em comparação aos efeitos morais e espirituais da Queda! É somente através da consulta das Sagradas Escrituras que somos capazes de obter alguma concepção da extensão dessa terrível calamidade.

Quando dizemos que o homem é totalmente depravado, queremos dizer que a entrada do pecado na constituição humana afetou toda parte facultativa do homem, todo seu ser.

Depravação total significa que o homem é, em espírito, alma e corpo, escravo do pecado e cativos ao pé do diabo, “...nos quais andastes outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da desobediência;” Efésios 2.2.

O homem é incapaz de realizar suas próprias aspirações e concretizar seus próprios ideais. Há uma incapacidade moral que o paralisa. Não é um homem livre, mas em vez disso, escravo do pecado e de Satanás: “Vós sois do diabo, que é vosso pai, e quereis satisfazer-lhe os desejos. Ele foi homicida desde o princípio e jamais se firmou na verdade, porque nele não há verdade. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira.” João 8.44.

O pecado é mais que um ato ou uma série de atos, é um homem de maquiagem. O pecado cega o entendimento, corrompe o coração e aliena a mente para ir a Deus. A vontade não tem como escapar. A vontade está sob o domínio do pecado e de Satanás. Portanto a vontade não é livre. Em suma, as escolhas amorosas e afetivas que fazem, fazem por causa do estado do coração, e o coração é enganoso acima de todas as coisas, e perverso: ”não há quem entenda, não há quem busque a Deus;” Romanos 3.11.



sábado, 29 de dezembro de 2012

A Chave das boas obras não abre a porta – C. H. Spurgeon


          A Escritura nos diz que as obras não podem salvar. Contarei uma história bem conhecida, para que nem os mais simples deixem de entender o que quero dizer. Certo dia um pastor estava a caminho do lugar onde ia pregar. Seu caminho levou-o pelo alto de um monte, e abaixo dele via-se as aldeias adormecidas em sua beleza, os campos de trigo imóveis na primeira luz do sol. Ele, porém, não prestou atenção nisso porque viu uma mulher saindo da porta da sua casa que, ao vê-lo, veio em sua direção com a maior ansiedade e disse:

— Meu senhor, tem algumas chaves aí? Eu quebrei a chave do meu armário, e preciso tirar algumas coisas.

Ele respondeu:

— Eu não trouxe nenhuma chave. — Ela ficou decepcionada, porque esperava que alguém tivesse alguma chave.

Mas ele continuou: — Imaginemos que eu tivesse alguma; é bem possível que ela não encaixasse na fechadura, e a senhora ficaria sem poder tirar as coisas que deseja. Mas não desanime; espere por alguém outro.

Entretanto, no desejo de aproveitar a situação, ele perguntou:

— A senhora já ouviu falar da chave do céu?

— Oh, sim — ela disse, — já vivi bastante tempo e fui à igreja o suficiente para saber que, se trabalhamos bastante e conseguimos o pão com o suor do rosto, tratarmos bem nossos próximos e nos comportamos, como diz o Catecismo, de modo humilde e reverente diante de todos os que são melhores do que nós, e se fazemos nossa obrigação na estação da vida em que Deus se agradou de nos colocar, e fazemos nossas orações regularmente, seremos salvos.

— Ah — ele retrucou, — minha senhora, essa é uma chave quebrada, porque a senhora quebrou os mandamentos; a senhora não fez todas as suas obrigações. A chave é boa, mas a senhora a quebrou.

— Por favor, senhor — disse ela, vendo que ele entendia do assunto e com um olhar assustado, — o que foi que eu esqueci?

— Bem — respondeu ele, — a senhora esqueceu a coisa mais importante, o sangue de Jesus Cristo. A senhora não ouviu falar que a chave do céu está presa ao seu cinto? Quando ele abre, ninguém pode fechar; quando ele fecha, ninguém pode abrir. — Explicando melhor para ela, ele continuou: — E Cristo e só ele quem pode abrir o céu para a senhora, e não as suas boas obras.

— Mas, senhor pastor — exclamou ela, — quer dizer que nossas boas ações são desnecessárias?

— De forma alguma, quando juntas com a fé. Se a senhora crê primeiro, pode fazer tantas boas ações quantas quiser. No entanto, se a senhora crê, nunca mais vai confiar nelas, porque se o fizer, a senhoras arruinou-as, e não são mais boas ações. Faça quantas boas obras quiser, mas coloque sua confiança totalmente no Senhor Jesus Cristo; se não o fizer, sua chave jamais abrirá a porta do céu.

Portanto, meus ouvintes, precisamos ter fé autêntica porque a velha chave das obras foi tão quebrada por nós que jamais entraremos no paraíso com ela. Se alguém aqui acha que não tem pecados, vou ser direto: você está se iludindo, e não há verdade em você. Se você imagina que por suas boas obras entrará no céu, jamais houve ilusão mais fatal. No último grande dia você descobrirá que suas esperanças eram inúteis, e que, como folhas secas das árvores no outono, suas ações mais nobres serão levadas pelo vento para o fogo onde você mesmo sofrerá para todo o sempre. Preste atenção em suas boas obras; faça-as depois de crer, mas lembre-se, o meio de ser salvo é simplesmente crer em Jesus Cristo.

Os 10 pastores que não respeito e não admiro - Por André Sanchez



         Maus líderes existem aos montes dentro das igrejas. O joio está espalhado dentro da igreja como ensinam as escrituras (Mt 13. 26). Isso não é novidade para ninguém. Apesar de designar aqui o termo “pastores” a essas pessoas que citarei abaixo, não tenho a intenção de diminuir aqueles que fazem jus a esse termo tão lindo mostrado nas escrituras, e que realmente pastoreiam de coração as ovelhas do Senhor. Usei esse termo somente para facilitar a identificação dessas pessoas.

OS DEZ PASTORES QUE NÃO RESPEITO E NÃO ADMIRO:

1- O que faz do púlpito um palco de shows = A exposição da Palavra é esquecida e substituída pelo talento hollywoodiano desse pastor, que explora as mais diversas técnicas para cativar os seus expectadores, fazendo do show o protagonista do culto. Ele é a estrela e não Cristo e Sua palavra. Seu púlpito é lugar de entretenimento, de show, e não de pregação, de transmissão da voz de Deus.

2- O que explora financeiramente as ovelhas = Esse pastor é muito ambicioso e tem planos de crescimento. Porém, para a realização dos seus planos, precisa de muito dinheiro. E esse dinheiro é retirado das ovelhas, através das mais diversas técnicas de extorsão (legais) – e algumas vezes ilegais e antiéticas. Ele não liga para o que a Bíblia ensina e inventa formas de arrecadação para realizar seus sonhos megalomaníacos. As ovelhas são iludidas, exploradas e sugadas até a última gota que podem dar.

3- O que insiste em querer fazer a agenda de Deus = Um pastor que quer determinar lugar, dia e hora para Deus agir não merece meu respeito. Segunda-feira: Deus age na família; terça-feira: nas finanças; quarta-feira: Deus dá o Espírito Santo; quinta-feira: Deus faz conversões e sexta-feira: Deus liberta as pessoas de demônios. Deus agora está preso em uma agenda criada pelo homem? Para esse pastor, Deus deve adequar-se à sua programação semanal.

4- O que ilude as pessoas com amuletos, objetos ungidos e unções que não vêm de Deus = Esse pastor escraviza pessoas em crendices e superstições que não são encontradas e ordenadas na Bíblia. Desvia a fé que deveria ser unicamente no Deus soberano para objetos e unções – falsas – e extravagantes. Trabalha com a ilusão, com a ambição, com a falta de conhecimento de muitas das ovelhas que lhe ouvem. É um ilusionista do púlpito!

5- O que “profetiza” o que Deus não mandou profetizar = Usa sua influência sobre as pessoas para “profetizar” e “revelar”. Porém, não usa a Bíblia, que é a revelação e é onde se encontram as profecias de Deus para a vida de seus servos. Lança profecias das mais variadas para as pessoas. Normalmente suas profecias são absurdas e vazias, porém, a cegueira e falta de conhecimento das pessoas sobre a Palavra de Deus, abre portas para que essas “profecias” sejam cridas como verdade.

6- O que faz com que seus fieis o adorem = Ele é visto como um semideus pelos seus fieis. Ele é o poderoso, ele faz milagres e sinais acontecerem, ele é o rei e o centro dos cultos. O pior de tudo é que não faz nada para mudar essa situação, pois adora ser paparicado, adora status, adora demonstrar seu grande “poder” e ser ovacionado pela multidão. Seu prazer é ver multidões afluindo em sua direção com desejo de glorificá-lo. Não prega para pouca gente, só aparece quando tem pessoas suficientes para massagear seu ego insuflado.

7- O que usa o dinheiro das ofertas para seu próprio enriquecimento = Esse pastor-empresário é formado e pós-graduado em enriquecimento usando a igreja. Tem fortuna e bens luxuosos, tudo adquirido com a ajuda das ofertas dos membros de sua igreja e de quem mais querer ajudá-lo a “evangelizar”. Segundo ele diz, todo o dinheiro das ofertas é usado para a obra de Deus, porém, seu patrimônio o acusa. Ele engana multidões – e babacões – que bancam sua vida de ostentação e riqueza, pois não podem questionar a palavra do todo poderoso líder.

8- O que prega a teologia da prosperidade = Um pastor que diz que pobreza é maldição, que o crente verdadeiro será reconhecido pela sua prosperidade material, e outras abobrinhas sem embasamento bíblico, não merece admiração. Se a teologia da prosperidade é um câncer como alguns dizem, esse pastor é um espalhador de doenças no meio do povo.

9- O que usa versículos isolados da Bíblia para fundamentar doutrinas destruidoras = Esse pastor adora inventar doutrinas usando versos bíblicos isolados, cuja interpretação isolada, sem considerar contextos e outras boas regras de interpretação, favoreçam seus pensamentos e desejos. É um manipulador ardiloso dos textos sagrados, visando unica e exclusivamente que a Bíblia se enquadre em seus pensamentos e planejamentos.

10- O que [acha] que determina a ação de Deus = É uma piada dizer que um homem determina algo ao Todo-Poderoso, mas essa ousadia acontece. Palavras ousadas saem da boca desse pastor, que ora determinando, ordenando, exigindo que Deus faça determinadas coisas que, segundo ele, Deus tem de fazer. Coitado, não tem nem noção da besteira que faz! E o pior: ensina as pessoas a agirem também assim!

NÃO POSSO ADMIRAR E RESPEITAR PASTORES COMO ESSES!

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

A igreja de Cristo e os Desafios do Novo Milênio - Autor: Franklin Ferreira



Vivemos numa época chamada por muitos de “pós-moderna”, caracterizada por forte desconfiança da razão, muitas e novas “verdades”, individualismo e consumismo. Há uma semelhança muito grande entre o nosso tempo e a época em que o cristianismo surgiu. O que temos visto é o ressurgimento de uma cultura pagã, muito parecida com a cultura do tempo de Jesus e dos apóstolos. A Igreja Cristã hoje é ignorada pelo mundo, tendo que lutar por sua sobrevivência ao lado de muitos outros movimentos religiosos. Estas mudanças, que estão ocorrendo no mundo, tem tido poderosa influência sobre nossa doutrina, nossa pregação e nossa forma de ser igreja. Este estudo é dividido em duas partes. Na primeira, examinaremos brevemente o impacto na igreja de uma forma de pensar “pós-moderna”, e, na segunda parte, examinaremos onde a história da Igreja pode nos ajudar a mantermos a fé evangélica de forma fiel à herança cristã.

1. Qual o impacto da forma de pensar de nosso tempo na vida da igreja?

O impacto da “pós-modernidade” pode ser visto de forma muito forte no meio evangélico hoje. Atualmente é cada vez menor o número de pessoas que buscam adorar a Deus “em Espírito e em verdade” (Jo 4.24). Em nossas igrejas temos visto a influência deste novo paganismo, levando nossas comunidades a adotar ordens de culto em que o sentimento de reverência cede lugar à descontração e o bem-estar do adorador torna-se mais importante que a sua humilhação e dedicação a Deus. O Senhor Deus é transformado numa espécie de “força”, disponível sempre que necessário, mas que não incomoda. Louvor e adoração espontânea são a ênfase dos cultos – a pregação da Palavra de Deus muitas vezes é desprezada! Neste contexto, o canto e o louvor produzem um elevado clima emocional, onde é proposta uma “teologia” que não se apóia muito numa doutrina, mas que é baseada numa experiência emocional dos crentes, sem um apelo à razão. Por outro lado, o que podemos constatar é que a emocionalidade buscada pelos cristãos muitas vezes é pobre em relações de amizade profundas e verdadeiras. É por isso que poderíamos sugerir que a igreja tem sido influenciada pelo discurso pós-moderno, preso às emoções e individualista. O importante é só o que o fiel consegue experimentar!

A crítica atual à razão e à instituição, além de promover divisões nas igrejas, as tem deixado sem defesa para as novas tendências teológicas. Por isso, os cristãos de hoje não vêem dificuldades nem empecilhos em assumir conceitos e palavras que fazem parte de outros grupos religiosos, inclusive surgidos em esferas opostas ao cristianismo. Podemos ver esta descaracterização do evangelho naqueles que acreditam em “simpatias”, copos d’água em cima do rádio (ou televisão) e benzedeiras, imitando o catolicismo popular, criando até mesmo uma versão “evangélica” das superstições populares da Idade Média, como vendas de “óleo ungido”, “água do Rio Jordão”, etc. Outros entram em “transe” nas reuniões, e outros viajam quilômetros somente para orar com alguém que, supostamente, tem dons especiais, ou que sua oração é “mais poderosa”. Mesmo os cultos de origem africana, como o candomblé e a macumba, encontram certa semelhança em algumas igrejas evangélicas, onde indivíduos caem e rolam no chão, supostamente possuídos por demônios, tais como os possuídos por “espíritos” nos “cultos afros”. Até o discurso de tais reuniões é usado em meio à obsessão por demônios, pela qual passa a igreja evangélica no Brasil (“maldição hereditária”, “amarrar espíritos”, “tranca-ruas”, etc.). A própria simplicidade bíblica (Fp 4.11; 1Tm 6.8; Hb 13.5) é substituída pela teologia da prosperidade com seu vocabulário sem significado, “eu repreendo”, “eu declaro”, “tá amarrado”.

O mais trágico é que há igrejas ensinando que para uma pessoa ser salva ela precisa cumprir uma elaborada lista de itens, da qual constam: receber o Senhor Jesus como único salvador, participar das “reuniões de libertação” da igreja para se ver livre do diabo, buscar o batismo com o Espírito Santo, andar em santidade, ler a Bíblia diariamente, evitar más companhias, ser batizado, freqüentar as reuniões de membros da igreja, ser fiel nos dízimos e nas ofertas e orar sem cessar e vigiar. Essas igrejas acabam confundindo salvação com santificação. E, pior ainda, mesmo cumprindo toda a lista, no entender destas igrejas, um cristão pode vir a perder a salvação. Mas as Escrituras claramente nos ensinam que homens e mulheres pecadores são salvos somente pela fé, somente em Cristo! Parece que os dirigentes destas igrejas nunca leram as epístolas de Paulo aos Romanos e aos Gálatas!

Estas tendências são extremamente perigosas, porque o cristianismo, que sempre sofreu ameaças de ser seduzido pela cultura de seu tempo (e por vezes sucumbiu a ela), mais uma vez está diante deste desafio. A cultura do prazer, do individualismo, das soluções mágicas de nosso tempo, de um “deus” que pode ser manipulado através de técnicas, tem agora o seu representante “cristão”. A partir desse quadro, podemos facilmente perceber que o resultado será uma espiritualidade sem significado. É interessante notar que as antigas confissões de fé cristãs, seguindo os ensinamentos das Escrituras, afirmavam que a pureza ou não de uma igreja se mede pela fidelidade com o qual o Evangelho é pregado (o que inclui as doutrinas centrais do cristianismo) e as ordenanças celebradas (o que aponta para a teologia prática das igrejas), e não pela quantidade de membros que elas conseguirem!

2. Aprendendo da História: uma direção para a Igreja

(1) Se desejamos ser uma igreja fiel, precisamos redescobrir as doutrinas centrais da fé cristã – e isto não é pouca coisa! Precisamos estudar todas as doutrinas bíblicas, buscando saber quais são aquelas que são vitais para nossa salvação, e quais são as que podemos ter opiniões diferentes. Então, a partir deste ponto, devemos pregar e ensinar doutrinariamente, enfatizando a centralidade das Escrituras, a doutrina da trindade, que nos ensina que Deus é o Pai, o Filho e o Espírito Santo, o ofício e a obra de Cristo, verdadeiro Deus, verdadeiro homem, o pecado e a culpa, expiação, regeneração, a fé e o arrependimento, a justificação, a santificação como obra do Espírito, julgamento, céu e inferno, e, em tudo isto, denunciando o cristianismo hipócrita e nominal. Tragicamente temos sido afastados “da simplicidade e da pureza que há em Cristo Jesus” (1Co 11.4). Nossa atenção também precisa ser chamada para o fato de que a verdadeira doutrina é que produz a unidade na Igreja (Ef 4.1-16).

(2) Agora, uma palavra especial para aqueles que têm servido à igreja na pregação e no ensino. Não basta apenas uma recuperação teológica, pois se nossa teologia não serve para ser pregada, então ela é uma má teologia.Precisamos recuperar uma pregação bíblica e doutrinária. Precisamos de pregadores expositivos, que busquem pregar toda a Palavra de Deus, e saibam que só o Espírito Santo, ligado à Palavra, pode salvar pecadores. O que é a pregação expositiva? Talvez, melhor do que definir, seja ilustrar. Martinho Lutero (1483-1546) pregava da seguinte forma para sua congregação: no domingo, às 5h: Epístolas Paulinas; às 9h: os Evangelhos; à tarde: o catecismo; segundas e terças: o catecismo; quarta: Evangelho de Mateus; quinta e sexta: Epístolas Gerais; sábado: Evangelho de João. Em nosso tempo, D. M. Lloyd-Jones (1899-1981) pregou dez anos na Epístola aos Romanos, e seis anos na Epístola aos Efésios – e sua igreja ficava lotada! Lutero, Lloyd-Jones e outros que têm seguido este método de pregação, têm buscado enfatizar “todo o conselho de Deus” (At 20.27), ensinando toda a Bíblia para o povo.

No tempo da Reforma, a promoção deste tipo de pregação era um claro ataque contra os métodos de ensino católicos. Estes usavam a dramatização, que era chamada de “dramatização dos mistérios”, quando atores profissionais eram pagos para, junto ao altar, representar diante do povo, que eles consideravam incultos e incapazes, as verdades das Escrituras – que muitas vezes eram romanceadas! Mas, segundo uma antiga confissão de fé, “a pregação da Palavra de Deus é a Palavra de Deus”! Então, por causa de seu alto conceito das Escrituras (1Tm 3.16; 2Pe 1.19-21), por entender que a exposição da Palavra é o meio de salvação (Rm 10.13-17; 1Pe 1.23), e que o homem, por ter a imagem de Deusé um ser com capacidades racionais, nossos pais espirituais rejeitaram estes acréscimos. O único “sacramento” que eles aceitaram era a pregação da Palavra. Além disto, a pregação bíblica não pode ficar de fora dos cultos, pois é parte integrante da adoração. Precisamos voltar a ensinar toda a Palavra, não apenas aquilo que gostamos mais, ou que nos é mais familiar, mas toda a Palavra de Deus. Quando o fiel ensino e a pregação da Palavra são negligenciados, sempre surgirão superstições e crendices dentro da própria igreja evangélica. Esta ênfase se torna mais urgente quando vemos que, em recente pesquisa, a Sociedade Bíblica Ibero-americana divulgou que 51% dos pastores evangélicos no Brasil nunca leram a Bíblia inteira! A ênfase que Jesus dá a crermos nele “como diz a Escritura” nos ensina que a doutrina correta tem poder para produzir vida (Jo 7.37-39)!

(3) Precisamos redescobrir uma nova forma de ser igreja. O Novo Testamento oferece limites para sermos igreja, mas dentro destes limites há muita liberdade para adaptações às mudanças que aparecem nos diferentes lugares e épocas. Partindo deste ponto, precisamos reafirmar de forma criativa a vida em comunidade. Para isto devem ser encorajados meios para incluir os vários dons espirituais dos cristãos no ministério de nossas igrejas, lembrando que cada crente é importante e tem um ministério necessário no Corpo de Cristo (Rm 12.4-8; 1Co 12.8-11, 28-30; Ef 4.11-16; 1Pe 4.8-11). Ao mesmo tempo, todos os membros deveriam estar conscientes de suas responsabilidades de mútua submissão e auto-doação na igreja em que participam (Ef 5.18-21). A igreja, enquanto estabelecida por verdades bíblicas, existe para nutrir relações de cuidado entre seus membros (1Co 13.1-13). Para imitar a igreja do Novo Testamento, a igreja local tem que cultivar amizades profundas. Cultos nos lares, núcleos de estudos bíblicos, retiros e outras formas de comunhão contribuem para reunir em amor o povo de Deus, exaltando a alegria e o amor da Trindade, antecipando a comunhão abençoada do céu.

O preço do discipulado e a disciplina precisam novamente ser enfatizados na igreja, pois o que tem prevalecido em nosso meio é conhecido como “graça barata”. Não podemos nos deixar de espantar com o ataque de Dietrich Bonhoeffer (1906-1945) contra esta perversão da livre graça de Deus: “Graça barata significa a graça vendida no mercado como quinquilharia ordinária… Graça barata não é o tipo de perdão que nos liberta dos laços do pecado. Graça barata é a graça que concedemos a nós mesmos. Graça barata é a pregação do perdão sem a exigência do arrependimento, batismo sem disciplina na igreja, comunhão sem confissão, absolvição sem confissão pessoal. Graça barata é a graça sem discipulado, graça sem a cruz, graça sem Jesus Cristo vivo e encarnado”.

Precisamos também recuperar o rico conceito bíblico de sacerdócio de todos os crentes (1Pe 2.5,9; Ap 1.6; 5.10; 20.6). Segundo Lutero, todo cristão é sacerdote de alguém, e somos todos sacerdotes uns dos outros. Este sacerdócio deriva diretamente de Cristo, pois “somos sacerdotes como Ele é sacerdote”. É uma responsabilidade tanto quanto um privilégio: “O fato de que somos todos sacerdotes significa que cada um de nós, cristãos, pode ir perante Deus e interceder pelo outro. Se eu notar que você não tem fé ou tem uma fé fraca, posso pedir a Deus que lhe dê uma fé sólida.” Não podemos ser cristãos sozinhos, precisamos da “comunhão dos santos”: uma comunidade de intercessores, um sacerdócio de amigos que se ajudam, uma família em que as cargas são compartilhadas e suportadas mutuamente. Nem todos podem ser pastores, mestres ou conselheiros. Há um só “estado” (todos os cristãos são sacerdotes), mas uma variedade de funções (cada cristão tem um chamado específico da parte de Deus, para glorificá-Lo no mundo). Em todas estas coisas, somos ensinados que Deus, em Cristo, por meio do Espírito, nos chama como indivíduos para vivermos em comunidade, pois não existe uma fé solitária segundo o Novo Testamento (Hb 10.19-25).

Conclusão

Num tempo de mudanças tão profundas e complicadas, temos diante de nós uma grande tarefa – a de, na dependência do Espírito, orar, pregar e ensinar, de tal forma que a Igreja de Cristo passe da infantilidade para a maturidade (Ef 4.11-16). Uma petição do Livro de Oração Comum expôs toda nossa responsabilidade e toda a nossa esperança na tarefa de proclamarmos com força renovada a fé evangélica: “Todo-poderoso e eterno Deus, que pelo Espírito Santo preside no concílio dos apóstolos, livra-nos do erro, da ignorância, do orgulho e do preconceito; e confiados em tua misericórdia, te imploramos, dirige, santifica e governa sobre nosso trabalho, pelo grande poder do Espírito Santo, a fim de que o confortante evangelho de Cristo seja verdadeiramente pregado, verdadeiramente recebido e verdadeiramente seguido em todos os lugares, para a derrota do reino do pecado de Satanás e da morte; até que ao fim todas as tuas ovelhas dispersas, juntadas no teu aprisco, se tornem participantes da vida eterna; pelos méritos e morte de Jesus Cristo, nosso Salvador. Amém”.

Autor: Franklin Ferreira, é teólogo, escritor e editor da Editora Fiel.
Fonte: [ Púlpito Cristão ]
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