O teor do evangelho gira em torno do fato de que o
homem está morto em seus pecados, e que a vida eterna é um dom de Deus, e se
colocaria contra a totalidade deste teor básico do evangelho quem defendesse
que o homem pode conhecer e amar a Cristo sem a atuação do Espírito Santo. O
Espírito Santo encontra os homens tão desprovidos de vida espiritual, como
aqueles ossos secos na visão de Ezequiel; o Espírito tem de juntar cada osso
com seu osso, até reconstituir o esqueleto, e depois, vindo dos quatro cantos,
precisa soprar sobre esses ossos mortos a fim de que recebam vida. A não ser
pelo Espírito de Deus, as almas dos homens teriam de permanecer no vale de
ossos secos, mortas, e mortas para sempre.
Mas as Escrituras não dizem apenas que o homem está
morto em pecado; afirmam algo pior que isso: que ele, por natureza, é absoluta
e totalmente contrário a tudo que seja bom e reto. "Portanto a intenção da
carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem em verdade
o pode ser" Rom. 8:7. Folheemos as páginas da Bíblia e continuamente é
repetido que a vontade do homem é contrária às coisas de Deus. Que disse Cristo
naquele texto tão freqüentemente citado pelos arminianos para negar a doutrina
que tão claramente afirma? Que disse Ele aos que imaginavam ser possível ao
homem vir a Ele sem a influência divina? Primeiramente afirmou: "Ninguém
pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o trouxer". Entretanto, disse
algo ainda mais enfático: "E não quereis vir a mim para terdes vida".
O homem não quer vir. Aqui se encontra a coisa
fatal; não é apenas que o homem se encontra sem forças para fazer o bem, e sim
que é suficientemente poderoso para fazer o mal, de modo que a sua vontade está
perversamente disposta a ir contra tudo que é reto. Vá, arminiano, e diga a
seus ouvintes que eles podem vir a Cristo, se assim o desejam, mas saiba que o
seu Redentor o observa face a face e lhe diz que você está proferindo uma
mentira! Os homens não querem vir. Nunca virão por si mesmos. Ninguém pode
induzi-los a vir, nem mesmo forçá-los a vir com todas as suas ameaças, nem
seduzi-los com todos os seus convites. Eles não querem vir a Cristo para terem
vida. Até que o Espírito os traga, não quererão vir, nem poderão vir.
E é pelo fato de que a natureza humana é hostil ao
Espírito de Deus, que o homem odeia a graça, despreza a maneira pela qual se
oferece esta graça, e é contrário à sua natureza orgulhosa o humilhar-se para
receber a salvação pelos méritos de outro. Daí, pois, surge a necessidade de
que o Espírito opere diretamente no homem para mudar a sua vontade, corrigir as
inclinações do seu coração, e depois de colocá-lo no caminho certo, dar-lhe
forças para andar nele. Oh, se todos estudassem o homem e chegassem a
compreendê-lo, não poderiam deixar de ser zelosos nesta doutrina da necessidade
da obra do Espírito Santo! Com razão um grande escritor observou que jamais
conheceu um homem que sustentasse algum erro teológico, que ao mesmo tempo não
mantivesse alguma doutrina que atenuasse a depravação humana.
O arminiano diz que é verdade que o ser humano está espiritualmente
caído, todavia acrescenta que ele ainda possui o poder da vontade e essa
vontade é livre; ele pode levantar-se. Atenua-se dessa forma o caráter
desesperador da queda do homem. Por outro lado, o antinomiano afirma que o
homem não é responsável, pois nada pode fazer; por conseguinte não está
obrigado a fazer nada. Não é sua obrigação crer, nem é sua obrigação
arrepender-se. Vemos aqui que ele também atenua a condição pecaminosa do homem
e lhe faltam idéias corretas a respeito da Queda. Entretanto, uma vez mantida a
posição verdadeira, ou seja, a de que o ser humano não só está completamente
caído, perdido e condenado, e sim também de que é culpado e por si mesmo
impotente, então necessariamente você adotará a posição doutrinária correta em
todos os demais pontos do grande evangelho do Senhor Jesus. Desde que se creia
o que as Escrituras ensinam sobre o homem -posto que se aceite que o seu
coração é depravado, seus afetos corrompidos, seu entendimento obscurecido e
sua vontade pervertida, então você terá de sustentar que, se uma pessoa assim
tão miserável há de ser salva, essa salvação deverá ser efetuada pelo Espírito
de Deus, e por Ele somente.