Em tempos antigos, quando algumas das Igrejas de
Cristo começaram a livrar-se do jugo do Papado que pesava sobre seus pescoços,
o argumento usado contra a reforma era a necessidade de manter a unidade. "Você
precisa ser paciente com esta ou aquela cerimônia e com este ou aquele dogma;
não importa quão anticristão e profano. Você precisa ser paciente quanto a
isso, 'esforçando-vos diligentemente por preservar a unidade do Espírito no
vínculo da paz'".
Assim falou a velha serpente naqueles dias antigos: "A
Igreja é una; ai daqueles que semeiam o cisma! Pode até ser verdade que Maria
tenha sido posta no lugar de Cristo, que as imagens são adoradas, que
vestimentas e trapos podres são reverenciados, e que o perdão é comprado e
vendido para crimes de todo tipo; pode ser que a assim chamada igreja tenha se
tornado uma abominação e uma moléstia sobre a face da
terra; mas ainda assim, ' esforçando-vos diligentemente por preservar a unidade
do Espírito no vínculo da paz ', você deve curvar-se, reprimir o testemunho do
Espírito de Deus dentro de você, esconder a Sua verdade sob um alqueire, e
deixar a mentira prevalecer."
Este foi o grande sofisma da Igreja de Roma. Porém,
quando ela não pôde mais seduzir os homens falando de amor e união, ela passou
a usar o seu tom mais natural de voz, e amaldiçoou diretamente, a torto e a
direito, de todo coração: e manteve a maldição até que ela mesma expire!
Irmãos, não havia nenhuma força no argumento dos
Papistas. Efésios 4:3 insta para que nos esforcemos em manter a unidade do
Espírito, mas não nos diz para manter a unidade do mal, a unidade da
superstição, ou a unidade da tirania espiritual. A unidade do erro, da falsa
doutrina, da tirania dos bispos, pode incluir o espírito de Satanás; não temos
nenhuma dúvida disso; mas que esta seja a unidade do Espírito de Deus nós
negamos veementemente. A unidade do mal nós devemos demolir com todas as armas
que nossas mãos puderem agarrar. A unidade do Espírito, a qual devemos manter e
nutrir, é outra coisa completamente diferente.
Lembrem-se que somos proibidos de fazer o mal para
que venha o bem. Mas conter o testemunho do Espírito de Deus dentro de nós,
esconder qualquer verdade que tenhamos aprendido pela revelação de Deus,
refrear-nos de testemunhar pela verdade de Deus e da Sua Palavra contra o
pecado e a tolice das invenções dos homens, todos estes seriam pecados dos mais
imundos. Não ousamos cometer o pecado de extinguir o Espírito Santo, ainda que
seja com a intenção de promover a unidade.
Certamente a unidade do Espírito nunca requer algum
apoio pecaminoso; ela não é mantida suprimindo a verdade, e sim apregoando-a
por toda parte. A unidade do Espírito tem como sustentação, dentre outras
coisas, o testemunho de santos espiritualmente iluminados com relação à fé que
Deus revelou em Sua Palavra. Aquela unidade, é uma unidade totalmente diferente
que amordaçaria nossas bocas e nos transformaria em gado imbecilmente dirigido,
para ser alimentado e depois abatido ao bel prazer de mestres sacerdotais.
O Dr. McNeil disse, acertadamente,
que dificilmente um homem pode ser um Cristão sério em nossos dias sem ser um
controversista. Somos enviados hoje como ovelhas para o meio de lobos. Pode
haver acordo? Somos acesos como luminares no meio da escuridão. Poder haver
conciliação? Não foi o próprio Cristo que disse,"Não penseis que vim
trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada"? Vocês compreendem
como esse é o mais verdadeiro método de esforçar-se para manter a unidade do
Espírito; porque Cristo o homem de guerra, é Jesus o Pacificador; mas para a
criação de paz duradoura, espiritual, as falanges do mal devem ser destruídas,
e a unidade das trevas arrojada em tremor.
Peço sempre a Deus que nos preserve de uma unidade
na qual a verdade seja considerada sem valor, na qual princípios deem lugar à
políticas, na qual as virtudes nobres e varonis que adornam o herói Cristão
tenham que ser completadas por uma afetação efeminada de amor. Que o Senhor
possa nos livrar da indiferença para com a Sua Palavra e vontade; porque isso
cria a unidade fria de massas de gelo unidas em um iceberg, esfriando o ar por
milhas ao redor, a unidade dos mortos enquanto dormem nas sepulturas, lutando
por nada, porque não têm parte nem herança em tudo aquilo que pertence aos
viventes. Há uma unidade que raramente é quebrada: a unidade dos demônios que,
sob o serviço do seu grande mestre e senhor, nunca discordam nem disputam.
Protege-nos desta terrível unidade, ó Deus dos céus! A unidade dos gafanhotos
que têm um objetivo comum, com a sua glutonaria que arruína tudo ao seu redor;
a unidade das ondas de fogo de Tofete, que arrasta miríades para a miséria mais
profunda. Disso também, ó Rei dos céus, livra-nos para sempre!
Que Deus perpetuamente nos envie algum profeta que
clame em alta voz para o mundo: "Sua aliança com a morte será
anulada, e seu acordo com inferno não permanecerá". Que sempre
tenhamos alguns homens, mesmo que sejam ásperos como Amós, ou austeros como
Ageu, que denunciem sempre de novo qualquer associação com o erro e qualquer
acordo com o pecado, e declarem que estas coisas são abomináveis para Deus.
Nunca imaginem que a contenda santa seja uma
violação de Efésios 4:3. A destruição de todo tipo de unidade que não está
baseada na verdade é uma preliminar necessária à edificação da unidade do
Espírito. Precisamos primeiro derrubar estas paredes feitas de argamassa ruim –
estes muros cambaleantes construídos pelo homem – para que possa haver espaço
para as excelentes rochas dos muros de Jerusalém colocadas umas sobre as outras
para uma permanente e duradoura prosperidade.
Fonte: Charles H. Spurgeon – True unity promoted (Sermon 603)
Via: Bom Caminho | Congregação Puritana Livre - SP
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