sábado, 3 de março de 2012
Cristo morreu sob a ira de Deus -por Paul Washer
Cristo morreu sob a ira de Deus
Para obter a salvação de Seu povo, Cristo não somente sofreu o terrível desamparo de Deus, mas Ele bebeu o amargo cálice da ira de Deus e morreu uma morte sangrenta em lugar de seu povo. Somente assim a justiça divina pode ser satisfeita, a ira de Deus apaziguada, e a reconciliação possível.
No jardim, Cristo orou três vezes para que “o cálice” fosse removido d’Ele, mas todas as vezes a Sua vontade entregava-se a vontade do Pai. Devemos nos perguntar: o que continha nesse cálice para que fizesse com que Ele rogasse tão fervorosamente? O que continha no cálice para causar tal angústia que Seu suor se mesclasse com sangue? Frequentemente é dito que o cálice representava a cruel Cruz romana e a tortura física que lhe esperava – É dito que Cristo previu a ‘cauda de gato’ sendo usada em suas costas, as coroas de espinhas penetrando sua fronte, e os cravos atravessando Suas mãos e Seus pés. Ainda assim, aqueles que enxergam essas coisas como a fonte de Suas angústias não entendem a Cruz, nem o que ocorreu lá. Ainda que as torturas o cobrissem, pelas mãos humanas, elas faziam parte do plano redentor de Deus; Havia algo muito mais sinistro que evocou o clamor do Messias.
Nos primeiros séculos da igreja primitiva, milhares de cristãos morreram em cruzes. É dito que Nero os crucificava ao contrário, ele os cobria de alcatrão, e lhes ateava fogo para usar como luzeiros nas cidades de Roma. Através das épocas, desde então, um sem número de cristão foram levados às mais inquietantes torturas e, mesmo assim, é o testemunho de amigos e inimigos que muitos deles foram para a morte com grande coragem e ousadia. Será que devemos crer que os seguidores do Messias enfrentaram uma morte tão cruel com alegria, enquanto que o Capitão de sua Salvação se acovardou no jardim, com medo da mesma tortura? Acaso o Cristo de Deus temeu os chicotes e espinhos, cruzes e lanças, ou será que o cálice representava um terror infinitamente maior que a crueldade humana?
Para entender o conteúdo sinistro desse cálice, devemos nos dirigir às Escrituras. Existem duas passagens em particular que devemos considerar – uma nos salmos e a outra em Jeremias:
“Porque na mão do SENHOR há um cálice cujo vinho é tinto; está cheio de mistura; e dá a beber dele; mas as escórias dele todos os ímpios da terra as sorverão e beberão.” (Salmos 75:8).
“Porque assim me disse o SENHOR Deus de Israel: Toma da minha mão este copo do vinho do furor, e darás a beber dele a todas as nações, às quais eu te enviarei. Para que bebam e tremam, e enlouqueçam, por causa da espada, que eu enviarei entre eles.” (Jeremias 25:15-16).
Como resultado da incessante rebeldia dos ímpios, a justiça de Deus havia decretado um juízo contra eles. Deus, justamente, derramaria sua indignação sobre as nações. Ele colocaria o cálice de vinho da Sua ira em suas bocas e forçaria-lhes a tomar até o fim. O simples pensamento de que tal destino espera o mundo é absolutamente terrível, e ainda assim esse teria sido o destino de todos, exceto que a misericórdia de Deus buscou a salvação do povo, e a sabedoria de Deus elaborou um plano de redenção ainda desde antes da fundação do mundo.
O Filho de Deus se faria homem e caminharia sobre a terra em perfeita obediência à Lei de Deus. Ele seria como nós em todos os sentidos, e tentado em todas as maneiras como nós, mas sem pecado. Ele viveria uma vida perfeitamente justa para glória de Deus e em lugar de Seu povo. Então, no tempo designado, Ele seria crucificado pelas mãos de homens ímpios, e naquela cruz, Ele levaria a culpa de Seu povo, e sofreria a ira de Deus contra eles. O perfeito Filho de Deus e verdadeiro Filho de Adão juntos em uma gloriosa pessoa tomaria o amargo cálice da mão do próprio Deus e o beberia até o fim. Ele o tomaria até que fora “consumado”, e a justiça de Deus fora completamente satisfeita. A ira divina que devia ter sido nossa seria exaurida sobre o Filho, e por Ele, seria extinta.
Imagine uma represa que está cheia até a borda e está sendo pressionada pelo o peso da água. De uma vez só o muro protetor é removido e o poder destrutivo é liberado. Com a certeira destruição indo diretamente até um vilarejo, localizado em um vale próximo, de repente a terra se abre e traga a água que causaria tamanho arrasado. Da mesma forma, o justo juízo de Deus corria em direção a cada homem. Não se podia achar escape na montanha mais alta nem no abismo mais profundo. Os pés mais velozes não poderiam escapar, nem o melhor nadador suportar sua maré. A represa foi rachada e nada poderia conserta seu dano. Porém, quando toda esperança humana foi esgotada, no tempo oportuno, o Filho de Deus se interpôs. Ele se colocou entre a justiça divina e a Sua gente. Ele tomou a ira que seu povo tinham provocado e o castigo que eles mereciam. Quando Ele morreu nem uma gota de ira restou. Ele a bebeu toda!
Imaginem duas pedras de moinho, uma girando sobre da outra. Imaginem que entre as pedras existe um grão de trigo que é esmagado pelo grande peso. Primeiro, é moído até ser irreconhecível, e depois suas partes internas são espalhadas e moídas até se tornarem pó. Não há qualquer esperança de reconstruí-lo. Tudo está perdido além de qualquer esperança. Assim, de igual maneira, “ao SENHOR agradou moê-lo” (Isaías 53:10), a Seu próprio Filho, e colocá-lo em indescritível angústia. Portanto, agradou ao Filho submeter-se a tal sofrimento a fim que Deus fosse glorificado e o povo redimido. Não é que Deus se tenha sentido prazer no sofrimento de Seu amado Filho, mas através de sua morte, a vontade de Deus se cumpriu. Nenhum outro meio tinha poder de remover o pecado, satisfazer a justiça, e apaziguar a ira de Deus contra nós. A menos que esse divino grão de trigo tivesse caído ao chão e morrido, haveria permanecido sozinho sem um povo ou uma noiva. O prazer não estava no sofrimento, mas em tudo o que o sofrimento conseguiria: Deus seria revelado em uma glória ainda desconhecida aos homens e anjos, e um povo seria trazido a uma relação sem obstáculo com o seu Deus.
Em uma das histórias mais épicas do Antigo Testamento, o patriarca Abraão recebe a ordem de levar seu filho, Isaque, ao monte Moriá e ali o oferecesse como sacrifício a Deus.
“Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que eu te direi.” (Gênesis 22:2).
Que carga foi posta sobre Abraão! Não podemos nem imaginar a tristeza que encheu o coração do velho homem e a tortura que cada passo da viagem trouxe. As Escrituras são cuidadosas em nos contar que ele foi ordenado a oferecer seu “filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas”. A especificação parece planejada para chamar nossa atenção e nos fazer pensar que há um significado oculto nessas palavras, além do que podemos enxergar.
No terceiro dia os dois chegaram ao lugar indicado, e o pai atou a seu amado filho, com suas próprias mãos. Finalmente, em submissão ao que deveria fazer, pôs sua mão sobre seu filho, “e tomou o cutelo para imolar o seu filho”. Nesse momento, a misericórdia e a graça de Deus se interpuseram, e a mão do ancião foi detida. Deus o chamou desde o céu e disse:
“Abraão, Abraão!... Não estendas a tua mão sobre o moço, e não lhe faças nada; porquanto agora sei que temes a Deus, e não me negaste o teu filho, o teu único filho.” (Gênesis 22:12).
À voz do Senhor, Abraão levantou os olhos e viu a um carneiro enroscado pelos chifres. Tomou o carneiro e o ofereceu em lugar de seu filho. E logo nomeou o lugar de YHWE-Jireh, ou “O SENHOR PROVERA”. É um dito fiel que permanece até o dia de hoje, “No monte do SENHOR se proverá” (Gn 22:14). Ao ver o encerramento desse momento épico na história, não somente Abraão, mas também todos os que já leram esse acontecimento dão um suspiro de alívio, que o jovem tenha sido poupado. Pensamos nós “que final lindo”, mas esse não era o fim, era simplesmente um intervalo.
Dois mil anos mais tarde, as cortinas voltam a se abrir. O fundo é escuro e sinistro. No centro do cenário está o Filho de Deus no monte, chamado Lugar da Caveira. Ele está atado pela obediência à vontade de seu Pai. Ele está pendurado levando o pecado de Seu povo. Ele é maldito – traído por sua criação e desamparado por Deus. Então, o silêncio é rasgado com o horrível estrondo da ira de Deus. O pai toma o cutelo, levanta o braço, e sacrifica a “teu filho, único filho, a quem amas” e as palavras do profeta Isaías são cumpridas:
“Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados... Todavia, ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom prazer do SENHOR prosperará na sua mão” (Isaías 53:4,5,10).
É uma injustiça ao Calvário que a verdadeira dor da cruz frequentemente é floreada por uma visão romântica e menos poderosa. Frequentemente se pensa e se prega que o Pai olhou desde o céu e testemunhou o sofrimento que era acumulado sobre Seu Filho por mãos humanas, e que Ele contou tal aflição como pagamento pelos nossos pecados. Isso é heresia da pior classe. Cristo satisfez a justiça divina não somente suportando a aflição dos homens, mas suportando e morrendo sob a ira de Deus. É necessário mais que cruzes, coroas de espinhos, cravos e lanças, para pagar pelo pecado. O crente é salvo não só pelo que os homens fizeram a Cristo na cruz, mas pelo que Deus fez a Ele – Ele o moeu sob toda a força de Sua ira contra nós. Raramente essa verdade se faz suficientemente clara em nossa pregação do evangelho!
A cortina se fecha com um Filho sacrificado e um Messias crucificado. Diferente de Isaque, não havia carneiro que morresse em Seu lugar. Ele era o cordeiro que morreria pelos pecados do mundo. Ele é a provisão de Deus para a redenção de Seu povo. Ele é o cumprimento daquilo que o carneiro e Isaque eram somente sombras. Nele o monte do Calvário é renomeado YHWE-Jireh, ou “O SENHOR PROVERA”. É uma palavra fiel até o dia de hoje que “No monte do Senhor se proverá”. O Calvário era o monte e a salvação foi providenciada. Assim, o crente discernente clama “Deus, Deus, sei que me amas já que não recusaste nem a teu filho, teu único filho”