Calvino reflete acerca do caráter precário e incerto da vida humana sobre a terra. Sua doutrina da providência não reflete um otimismo piedoso, mas resulta de uma avaliação realista das vicissitudes da vida e da ansiedade que elas produzem.
Ele critica duas concepções errôneas: o fatalismo e o deísmo. A doutrina estóica do destino pressupõe que todos os eventos são governados pela necessidade da natureza. Calvino pondera que, na concepção cristã, o “regente e governador de todas as coisas” não é uma força impessoal, mas o Criador pessoal do universo, que em sua sabedoria decretou desde a eternidade o que iria fazer e agora em seu poder realiza o que decretou.
Ele também combate a idéia de que Deus fez o mundo no princípio, mas depois o deixou entregue a si mesmo. Como mostram as Escrituras, Deus está contínua e eficazmente envolvido no governo da sua criação. Assim, a providência é uma espécie de continuação do processo criador, tanto nos grandes como nos pequenos eventos.
Essa ênfase na atividade imediata e direta de Deus no mundo leva Calvino a rejeitar a teoria traducianista da origem da alma, a idéia de que a alma é transmitida de geração a geração pelo processo da procriação humana (Lutero). Calvino cria que, toda vez que uma criança é gerada, Deus cria uma nova alma ex nihilo.
Apesar de sua interação direta com o mundo, Deus também pode usar causas secundárias para realizar a sua vontade. Ele pode até mesmo usar instrumentos maus (como Satanás e suas hostes), transformando o mal em bem.
Se Deus decreta cada evento, onde fica a responsabilidade humana? Calvino responde que a providência de Deus não atua de modo a negar ou tornar desnecessário o esforço humano. As próprias ações humanas são um dos meios pelos quais Deus realiza os seus propósitos.
O governo divino de todos os eventos não torna Deus o autor do pecado? Assim como Lutero, Calvino distingue entre a vontade revelada e a vontade oculta de Deus. Ao enviar Cristo para a cruz, a Bíblia diz que Herodes e Pilatos estavam cumprindo o que Deus havia determinado (Atos 4.27-28). Ao mesmo tempo, eles também estavam violando a vontade expressa de Deus revelada em sua lei.
Vez após vez Calvino apela ao mistério e incompreensibilidade das ações de Deus. O problema do mal é tão difícil precisamente porque não podemos entender como as tragédias da vida contribuem para a maior glória de Deus.
A fé verdadeira percebe que, por trás dos sofrimentos, que em si mesmos são maus, existe um Pai de justiça, sabedoria e amor que prometeu nunca abandonar-nos. Nessas questões, não se pode submeter Deus aos padrões humanos de julgamento.
Institutas