Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia (João 6.44)
Quão surpreendente é a
depravação do homem natural! As Escrituras nos ensinam isso
abundantemente. Todo pastor fiel levanta a sua voz como uma trombeta, para
mostrar isto às pessoas. E a primeira obra do Espírito Santo, no coração, é
convencer do pecado.
Na Palavra de Deus, não existe
uma descoberta mais terrível sobre a depravação do homem natural do que estas
palavras do evangelho de João. Davi afirmou: “Eu nasci na iniquidade, e em
pecado me concebeu minha mãe” (Sl 51.5). Deus falou por meio do profeta Isaías
(48.8): “Eu sabia que procederias mui perfidamente e eras chamado de
transgressor desde o ventre materno”. E Paulo disse: “Éramos, por natureza,
filhos da ira, como também os demais” (Ef 2.3). Mas nesta passagem de João
somos informados de que a incapacidade do homem natural e sua aversão por
Cristo são tão grandes, que não podem ser vencidas por qualquer outro poder,
exceto o poder de Deus. “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o
trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6.44). Nunca houve um mestre
como Cristo. “Jamais alguém falou como este homem” (Jo 7.46). Ele falava com
muita autoridade, não como os escribas, mas com dignidade e poder celestial.
Ele falava com grande sabedoria. Falava a verdade sem qualquer imperfeição.
Seus ensinos eram a própria luz proveniente da Fonte de Luz. Ele falava com
bastante amor, com o amor dAquele que estava prestes a dar a sua vida em favor
de seus seguidores. Falava com mansidão, suportando a ofensa contra Ele mesmo
vinda dos pecadores, não ultrajando quando era ultrajado. Jesus falava com
santidade, porque era Deus “manifestado na carne”. Mas tudo isso não atraía os
seus ouvintes. Nunca houve um dom mais precioso oferecido aos homens. “O
verdadeiro pão do céu é meu Pai quem vos dá... Eu sou o pão da vida; o que vem
a mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede” (Jo 6.32, 35). O
Salvador de que as pessoas condenadas necessitavam estava diante delas. Sua mão
lhes foi estendida. Ele estava ao alcance delas. O Salvador ofereceu-lhes a Si
mesmo. Oh! Que cegueira, dureza de coração, morte espiritual e impiedade
desesperadora existem na pessoa não-convertida! Nada pode mudá-la, exceto a
graça do Todo-Poderoso. Ó Homem destituído da graça de Deus, seus amigos o
advertem, os pastores clamam em voz alta, a Bíblia toda o exorta. Cristo, com
todos os seus benefícios é colocado diante de você. Todavia, a menos que o
Espírito Santo seja derramado em seu coração, você permanecerá um inimigo da
cruz de Cristo e destruidor de sua própria alma. “Ninguém pode vir a mim se o
Pai, que me enviou, não o trouxer”.
Quão invencível é a graça de
Jeová! Nenhuma criatura tem o poder de atrair o homem a Cristo. Exibições,
evidências miraculosas, ameaças, inovações são usadas em vão. Somente Jeová
pode trazer a alma a Cristo. Ele derrama seu Espírito com a Palavra e a alma
sente-se alegre e poderosamente inclinada a vir a Jesus. “Apresentar-se-á
voluntariamente o teu povo, no dia do teu poder” (Sl 110.3). “Acaso, para o
Senhor há coisa demasiadamente difícil?” (Gn 18.14.) “Como ribeiros de águas
assim é o coração do rei na mão do Senhor; este, segundo o seu querer, o
inclina” (Pv 21.1).
Considere um exemplo: um judeu
estava assentado na coletoria, próxima à porta de Cafarnaum. Sua testa estava
enrugada com as marcas da cobiça, e seus olhos invejosos exibiam a astúcia de
um publicano. Provavelmente ele ouvira falar de Jesus; talvez o tivesse ouvido
pregando nas praias do mar da Galiléia. Mas seu coração mundano ainda
permanecia inalterado, visto que ele continuava em seu negócio ímpio, assentado
na coletoria. O Salvador passou por ali e, olhando para o atarefado Levi,
disse-lhe: “Segue-me!” Jesus não disse mais nada. Não usou qualquer argumento,
nenhuma ameaça, nenhuma promessa. Mas o Deus de toda graça soprou no coração do
publicano, e este se tornou disposto. “Ele se levantou e o seguiu” (Mt 9.9).
Agradou a Deus, que opera todas as coisas de acordo com o conselho da sua
vontade, dar a Mateus um vislumbre salvador da excelência de Jesus; a graça
caiu do céu no coração de Mateus e o transformou. Ele sentiu o aroma da Rosa de
Sarom. O que significava o mundo agora para ele? Mateus não se importava mais
com os lucros, os prazeres e os louvores do mundo. Em Cristo, ele viu aquilo
que é mais agradável e melhor do que todas essas coisas do mundo. Mateus se
levantou e seguiu a Jesus.
Aprendamos que uma simples
palavra pode ser abençoadora à salvação de almas preciosas. Frequentemente
somos tentados a pensar que tem de haver algum argumento profundo e lógico para
trazer as pessoas a Cristo. Na maioria das vezes colocamos nossa confiança em
palavras altissonantes. No entanto, a simples exposição de Cristo aplicada ao
coração pelo Espírito Santo vivifica, ilumina e salva. “Não por força nem por
poder, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos Exércitos” (Zc 4.6). Se o
Espírito age nas pessoas, estas simples palavras: “Segue a Jesus”, faladas em
amor, podem ser abençoadas e salvar todos os ouvintes.
Aprendamos a tributar todo o
louvor e glória de nossa salvação à graça soberana, eficaz e gratuita de Jeová.
Um falecido teólogo disse: “Deus ficou tão irado por Herodes não lhe haver dado
glória, que o anjo do Senhor feriu imediatamente a Herodes, que teve uma morte
horrível. Ele foi comido por vermes e expirou. Ora, se é pecaminoso um homem
tomar para si mesmo a glória de uma graça tal como a eloquência, quão mais
pecaminoso é um homem tomar para si a glória da graça divina, a própria imagem
de Deus, que é o dom mais glorioso, excelente e precioso de Deus?” Quantas
vezes o apóstolo Paulo insiste, em Efésios 1, que somos salvos pela graça imerecida
e gratuita? E como João atribui toda a glória da salvação à graça gratuita do
Senhor Jesus — “Àquele que nos ama, e, pelo seu sangue, nos libertou dos nossos
pecados... a ele a glória e o domínio pelos séculos dos séculos. Amém!” (Ap
1.5, 6). Quão solenes foram as palavras de Jonathan Edwards, em sua obra
Personal Narrative (Narrativa Pessoal)! “A absoluta soberania e graça gratuita
de Deus, em demonstrar misericórdia àquele para quem Ele quer expressar
misericórdia, e a absoluta dependência do homem quanto às operações do Espírito
Santo têm sido para mim, frequentemente, doutrinas gloriosas e agradáveis.
Estas doutrinas têm sido o meu grande deleite. A soberania de Deus parece-me
uma enorme parte de sua glória. Tenho sentido deleite constante em aproximar-me
de Deus e adorá-Lo como um Deus soberano, rogando-Lhe misericórdia
soberana”.
Ao sentir-me à graça um grande
devedor Sou constrangido sempre, a todo instante! Que esta graça, com
algemas, meu Senhor, Prenda somente a Ti meu coração hesitante.
Robert Murray M’Cheyne
(1813-1843) foi ministro de St Peter’s Church Dundee, Escócia (1836-1843). Foi
um piedoso pastor evangélico e evangelista com grande amor pelas almas.