domingo, 29 de junho de 2014

O Discipulado na Missão da Igreja - Por Rev. Luiz Augusto Corrêa Bueno






I. Introdução

Uma das razões que nos estimula a escrever sobre o tema escolhido, é a crise por que passa a Igreja Evangélica Brasileira em seu âmbito eclesiástico, denominacional e geográfico com respeito a sua Missão.

Ao decorrer de meus anos de ministério pastoral e atualmente como professor e diretor de uma escola de treinamento missionário, sou levado a pensar que o momento da igreja brasileira em sua geração é por demais delicado. Isso porque, vemos as igrejas locais procurando ansiosamente meios de crescimento numérico, muitas delas, sinceramente, buscando cumprir o mandato de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas que em sua caminhada, tem abandonado princípios inegociáveis da Escritura Sagrada, resultando em uma situação de “stress” espiritual para a comunidade, a diluição da fé e o enfraquecimento qualitativo e orgânico dos crentes.

Que é mandamento de Nosso Senhor que cresçamos em número, ninguém duvida, contudo, seria pertinente levantarmos algumas ponderações:

• Qual a verdadeira motivação dos líderes das igrejas locais na busca ansiosa de um crescimento na igreja?
• Estamos observando um crescimento equilibrado nas igrejas locais?
• Qual o estilo de vida que Deus tem requerido de sua igreja na missão?
• Até que ponto podemos dizer que há um verdadeiro crescimento em nossas igrejas locais?

Nas palavras de um missiólogo norte-americano compreendemos muito bem o que a igreja evangélica brasileira está realizando em seus dias. Ele afirma que “a Igreja nasceu como um fato na Palestina, veio para a Grécia e tornou-se uma idéia, foi para Roma e tornou-se uma Instituição, foi para os Estados Unidos e tornou-se um empreendimento, veio para o Brasil e tornou-se um evento”.

Atualmente, a Igreja Brasileira está sofrendo, porque não acata o Discipulado como o verdadeiro estilo de vida cristão. Os crentes não são desafiados a fazer discípulos, e, por assim dizer, estão tranquilos com respeito a sua maneira de ser. Olhando para uma Teologia Bíblica Integral do Discipulado, quero levantar questões relevantes a respeito do Discipulado e ao mesmo tempo descobrir implicações práticas deste estilo de vida proposto por Jesus esquecido pelas nossas comunidades cristãs.

II. Definições gerais

Para que compreendamos o que vem a ser Discipulado, necessitamos recorrer à etimologia de algumas palavras que se nos apresentam nas Escrituras, com respeito a este fato. Necessitamos definir Discipulado em termos gerais e específicos, na busca dos vários significados que o original grego que no ajuda a discernir o assunto que desejamos tratar.

A primeira palavra que nos traz a mente a idéia de Discipulado é “Akoloutew” (Akolouteo). Traduzida por seguir, denota a ação de uma pessoa respondendo ao chamado do Mestre e cuja sua vida inteira é reformulada no sentido da obediência. A idéia no grego clássico era de alguém que seguia a Deus ou a Natureza como idéia filosófica, o mesmo se identificava mediante uma incorporação. Esta palavra no Antigo Testamento correspondia à “halak” que dava a conotação de “ir atrás de”. No Novo Testamento, Akolouteo é empregado 56 vezes nos Evangelhos Sinópticos e 14 vezes em João, 3 vezes em Atos, uma vez em Paulo e 6 vezes no Apocalipse. Embora sendo usada algumas vezes para denotar as multidões que “seguiam” a Jesus, ela somente terá uma importância maior quando atribuída ou vinculada a pessoas que estavam seguindo o Mestre.

Alguns textos, principalmente os que estão narrando o chamado vocacional dos discípulos por Jesus usam Akolouteo para evidenciar um convite muito mais desafiador do que diplomático.

Em Mt 9.9, Jesus chama a Mateus e diz “segue-me”. A mesma palavra é usada para o desafio colocado ao jovem rico, onde depois que ele vendesse todos os seus bens e desse aos pobres o mancebo deveria seguir ao Mestre. Quando Jesus fala realisticamente sobre o ser discípulo usa Akolouteo em Mt 8.22 para denotar a prioridade que os seus seguidores deveriam ter para com o seu projeto. O que nos chama a atenção é que “akolouteo” possui uma força muito grande, tanto historicamente como culturalmente para a época de Jesus.

Com um pano de fundo histórico, “seguir” era fator preponderante para alguém se fazer aluno nas escolas peripatéticas, em que o discípulo se fazia “um com o seu mestre” mas, sobretudo, se identificava com o mesmo de tal maneira que o colocava em primeiro lugar, deixando todas as coisas para trás, despojando-as dos níveis mais elevados de compromisso. Aprender, era de fato uma questão de vida, de exclusividade e de cumplicidade. Este aprender significava perder tudo para ganhar a vida, fosse no aspecto filosófico ou no religioso. No aspecto espiritual, Jesus chamava seus discípulos com autoridade divina, como os próprios profetas eram chamados por Deus no Velho Testamento.

A segunda palavra encontrada é “Mathetes”, (maqhths) “discípulo”. É aquela pessoa que ouve o chamado do Mestre e se junta a ele. É um aprendiz. Raiz da palavra “mantano” (mantano), a palavra era, no tempo clássico, um verbo entendido por “adaptar-se”. Alguém era chamado de Mathetes, quando se vinculava a outra pessoa a fim de adquirir conhecimento prático e teórico. Já no Antigo Testamento, a palavra equivalente no hebraico, possuía uma conotação mais fraca. A ênfase recaía sobre Israel como povo de Deus, no sentido que ele deveria aprender de Deus e se voltar para Ele constantemente. Contudo, a relação entre o “talmid” (aluno) e o seu “moré” (professor) era muito forte especialmente no judaísmo rabínico. O relacionamento entre o aluno e o professor tornava-se uma instituição para o estudo detalhado da Torá.

No Novo Testamento Mathetes tornou-se a palavra para indicar total devoção a alguém. A palavra usada, possuía uma conotação muito forte, onde o discípulo convivia com o mestre, recebendo conhecimento e especialmente no Discipulado de Jesus, estaria disposto a servir.

Outra palavra relacionada ao Discipulado é “mimeomai” (mimeomai), “imitar”. O verbo enfatiza a natureza de um tipo especial de comportamento, modelado em outra pessoa. Segundo Brown, “mimeomai” se aplica a pessoas específicas que são obviamente exemplos vivos para a vida da fé. Mesmo sendo o apóstolo Paulo aquele que usa freqüentemente esta palavra para motivar seus discípulos a uma vida de imitação, jamais ele se incluía como alvo final a ser imitado (I Co 11.1). Pelo contrário, ele sempre apontava a Jesus que deveria ser a proposta final de imitação e exemplo.

Chegamos a conclusão que Discipulado tem a ver com o próprio fato de ser da igreja de Nosso Senhor. Se analisamos estas palavras, definimos tal ação como a que o Mestre se propôs em seu ministério: Discipular homens, para que os mesmos pudessem, ao final de Sua jornada aqui, fazer com que Seus ensinos e mandamentos fossem sabiamente repassados na perspectiva da obediência, tornando os discípulos seus “seguidores”. Contudo, este “seguir” jamais viria sem um compromisso de vida, de dedicação, de amor e de entrega de vida plena ao Mestre. Conjugado a isto, o Mestre seria o alvo maior, como exemplo e modelo a ser imitado. Já não seria um movimento, mas sim, um estilo de vida que todos os seus seguidores assumiriam diante do mundo e chamariam outros a vivenciarem uma mudança radical em prol da glória de Deus e satisfação de seus corações.

Waylon Moore afirma que “Discipulado é o processo de tomar novos convertidos, educá-los e levá-los a um estado de maturidade e adulta comunhão com Cristo e de serviço eficiente na Igreja”. E continua: “fazer discípulo de uma pessoa é levá-la a experiência de ter Jesus como Senhor e Centro de sua vida. Ser discípulo implica num ato de entrega e num processo de obediência. Um homem é discípulo de Cristo, quando permanece em sua palavra, glorifica ao Pai e dá frutos. ( João 8.31;15.8)”.

Sem dúvida, a experiência de ser encontrado por Cristo através da fé é condiçãosine qua non para que o discipulado se inicie na vida de uma pessoa e o processo de obediência é o resultado sadio de alguém que está caminhando na fé. Além disso, Robert Coleman afirma ao comentar o texto de Mateus 28.18-20, que o Discipulado se refere ao “ir, batizar e ensinar particularidades de uma ação maior, ao que Jesus chama de “fazer discípulos”. São responsabilidades que derivam da direção do “fazer aprendizes de Cristo”. Coleman chama a atenção da igreja, dizendo que discipular homens e mulheres é a prioridade acerca da qual nossas vidas deveriam ser orientadas.

Já David Kornfield, trabalhando no Brasil, atualmente com pequenos grupos e Discipulado, em seu artigo Discipulado, a Verdadeira Grande Comissão, define Discipulado como “uma relação comprometida e pessoal em que um discípulo mais maduro ajuda outros discípulos de Jesus Cristo a se aproximarem mais dele e assim se reproduzirem” e argumenta: “se o Discipulado perder de vista o relacionamento comprometido e pessoal, deixa de ser um Discipulado bíblico”. A sua ênfase está nos relacionamentos. É no relacionamento pessoal e social que se descobre o verdadeiro valor do Discipulado. Se não há relacionamento interpessoal, então é impossível a realidade do Discipulado de Cristo.

Larry Richards, em seu livro Teologia do ministério pessoal comenta que “o Discipulado envolve a reformulação da vida do cristão em direção à obediência, a fim de que possa tornar-se como Jesus” e continua: “A missão da igreja não é simplesmente conseguir conversões, mas completar o processo da vida cristã fazendo discípulos”.

III. Bases Bíblicas e Históricas

Um dos maiores pecados da igreja, na sua missão é achar que Discipulado seja mais um método onde podemos implementar na igreja. Acredita a maioria dos líderes eclesiásticos que além dos vários programas que a igreja dispõe para atrair os convertidos, o Discipulado quando bem usado é um bom método para o crescimento da igreja. Muitos pastores e líderes quando discipulam tentam “incrementar” a igreja com mais este “programa”. Ao contrário do que se pensa, defendo Discipulado como um princípio geral que conduz os crentes a um estilo de vida. Longe da tentativa de forçar determinados textos, o Discipulado pelo pano de fundo histórico e contextual, fazia de Cristo o Mestre por excelência e seus discípulos como os que haviam deixado tudo e se propunham a caminhar com Cristo. Isto quer dizer que os mesmos decidiam mudar o seu próprio estilo de vida. Antes, senhores de suas próprias vidas, autores de seus projetos pessoais, agora, submissos e alunos da vida ao lado de Jesus. Quando olhamos para o contexto do treinamento rabínico, Richards citando Moses Aberbach, descreve o padrão de educação do discípulo. Diz ele:

“O padrão está ligado a um relacionamento pessoal entre aluno e professor. Embora o estudo pessoal não fosse desconhecido, era totalmente desaprovado, como passível de resultar em aberrações.
O treinamento recebido do mestre incluía muito mais do que o estudo acadêmico, estendendo-se para além da sala de aula. O discípulo passava a maior parte de tempo possível com o professor, muitas vezes vivendo com ele na mesma casa. Esperava-se que os discípulos não só estudassem a lei em todas as suas ramificações como também se familiarizassem com um estilo específico de vida, o que só podia ser feito mediante convivência constante com um mestre. Os rabinos ensinavam tanto pelo exemplo como por preceitos. Por esta razão o discípulo precisava anotar as conversas e hábitos diários do mestre, assim como o que ensinava.
Os alunos tratavam os professores com grande deferência e respeito. ‘‘Seguir’’ um mestre significava aceitar os seus ensinamentos, mas ao acompanhá-lo, esperava-se que os discípulos andassem literalmente atrás deles, de um lado ou de outro. Os alunos também serviam os professores de várias maneiras práticas que iam desde arrumar os bancos na sala de aula até fazer compras e cozinhar para eles. Ajudar o mestre na casa de banhos era um serviço tão comumente associado com o Discipulado que a frase: “Vou levar as roupas dele à casa de banhos“ tornou-se sinônimo, de ‘Vou ser seu discípulo”.

A despeito da subordinação e hábitos de respeito que caracterizavam o relacionamento mestre discípulo, este não era de forma alguma distante ou formal. O professor tentava educar os discípulos como filhos: cuidava deles, sustentava-os (no geral esta educação era financiada pelo rabino) e elogiava ou advertia os discípulos conforme o caso. Aberbach descreve a relação como um amor paternal-filial intenso.

O Velho Testamento nos relata discipulados significativos. Quando percorremos a História Bíblica, podemos nos lembrar do relacionamento de Moisés e Josué. O caráter da Missão de Moisés, quando recebera seu chamado no Monte Horebe, possuía essencialmente alguns objetivos: Retornar para o Egito, Libertar o seu povo do cativeiro, caminhar com este pelo deserto, sofrer as duras situações junto com o povo, partilhar das conquistas deste e estabelecê-lo na Terra Prometida. Porém, uma das marcas de sua liderança foi a formação e preparação de Josué para assumir a liderança do Povo de Israel. Seja em Êxodo ou Deuteronômio, observamos que havia uma ligação muito estreita entre ambos, a tal ponto de Deus depositar a mesma autoridade de Moisés sobre os ombros de Josué.

Quando voltamos os olhos para a época de Eli e Samuel, especialmente em seu chamado muito precoce para o profetismo de Israel (1 Sm 3), nota-se ali que Samuel convivia muito de perto com o Sacerdote Eli. A idéia era de fato um aperfeiçoamento através de um sistema relacional. A mesma situação acontecia entre Samuel e Natã, Elias e Eliseu, Eliseu e a Escola de Profetas. Exemplos onde a Escritura registra que o princípio do Discipulado estava latente neste período, contudo ainda não o era de forma patente na época e a partir de João Batista . No período do Novo Testamento iremos ver de fato o Discipulado sendo a busca da Igreja do Novo Testamento como um princípio de vida.

Seria importante falar sobre João Batista e seu ministério. Quando Jesus já desenvolvia seu ministério particular com seus discípulos, encontram-se várias declarações dos evangelistas a respeito dos discípulos de João Batista. Em alguns casos eram investigadores a mando do próprio profeta (Mt 11.2), ou então manifestavam práticas como a do jejum entre eles (Mc 2.18). Em outra situação, os discípulos de João Batista expressaram maior dedicação ao seu mestre do que os próprios discípulos do Senhor, pois nos diz Mc 6.29, que após o martírio do profeta, eles mesmos foram e sepultaram o seu mestre. Em Jo 1.37, nos parece que André e Pedro já eram discípulos de João, e que ao chamado do Mestre, não titubearam, mas preferiram Jesus a João. Tal atitude poderia expressar a fidelidade de João Batista em ensinar e preparar os seus seguidores acerca da vida e obra do Messias, da qual o próprio dizia que “não era digno de desatar-lhe as correias das alparcas”.

Se olharmos mais profundamente, concluiremos que o estilo de Jesus era pautado por alguns princípios. O sistema de Discipulado de Jesus baseava-se muito mais no relacionamento do que na absorção de conhecimento acadêmico ou intelectual. A idéia de Discipulado para Jesus como princípio não era a de transmissão de puro conhecimento. Quando olhamos para Marcos 3.14, o texto nos diz que na escolha dos discípulos, Jesus “designou doze para estarem com ele e para os enviar a pregar”, isto é, estar com Jesus seria, sobretudo, a marca do treinamento destes discípulos. Deste momento em diante ficava claro que o ensino de Jesus seria o da convivência pessoal. O estilo ou um modo de vida de Cristo seria impregnado na vida e no relacionamento daqueles discípulos. Tudo o que convergisse para Cristo no que se diz respeito a sua vida, seu ministério, suas obras, seus milagres, eles estariam testificando e provando. Quando vemos o testemunho do apóstolo João no início de sua primeira carta, ele declara: “O que era desde o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com nossos próprios olhos, o que contemplamos e as nossas mãos apalparam com respeito ao Verbo da vida” (I Jo 1.1).

Isto confirma que o Discipulado era muito mais que absorção de conhecimento intelectual, e sim um estilo de vida que marcaria para sempre a vida dos discípulos. Essa “pessoalidade” do ensino de Jesus, era sentido em todos os níveis. A proposta do Mestre era além da vivência relacional (Mc 3.8), a descoberta pelos próprios discípulos dos mistérios do Reino de Deus através das parábolas (Mt 13.1-52), o conhecimento de uma intimidade jamais declarada por Jesus às multidões, mas somente aos discípulos como no monte da transfiguração (Mt 17.1-8). Além disto a prática de ministério também era um ponto forte. Os discípulos necessitavam ser confrontados até mesmo com os endemoninhados (Mt 17.14-21). A prática da oração era algo essencial (Mt 26.36-46) e conjugado com esta, o próprio Jesus mantinha um ministério pastoral entre os mesmos, expressado especialmente no último contato com Simão Pedro (Jo 21.15-23). Mas o que aprendemos acerca do Discipulado em Jesus é de que seu trabalho com os discípulos era eminentemente pessoal. Jesus sempre manifestava interesse por pessoas em primeiro lugar.

Mesmo fora do Discipulado, quando Jesus evangelizava, especialmente no Evangelho de João vemos seus contatos pessoais de forma que produzia transformação na vida de todos que mantinham algum contato com o Mestre, isto é um verdadeiro nascer de novo. Isto se deu claramente com o Fariseu Nicodemus (Jo 3), com a mulher Samaritana (Jo 4) e com o paralítico (Jo 5). Até as expressões fortes de Jesus também tinham lugar em seu Discipulado, que geravam ira e abandono de Seu projeto por alguns discípulos (Jo 6). Jesus tinha por necessidade enfocar a realidade do pecado para as pessoas, mas nunca as deixava só. Seu Discipulado tinha a ver com a misericórdia, justamente tornado muito pessoal nas suas palavras para a mulher adúltera (Jo 8). O tratamento das moléstias físicas como no caso do cego de nascença foi um momento importante para pregar o evangelho do reino (Jo 9). Em todos os casos, Jesus sempre enfocava seu ministério discipulador de maneira muito pessoal e relacional.

A questão da relação de Jesus com os doze é sentida bem claramente a partir do capítulo 13 de João, em que o Ministério de Cristo, chamado de Ministério Particular acontece de maneira mais efetiva. As bases do Discipulado são lançadas a partir deste ponto. Jesus ensina aos seus discípulos que acima de tudo eles deveriam ter a pessoa de Jesus como ponto de referência, em que o modelo da Sua vida, deveria ser um alvo para eles. A humildade, a consciência do servir, era básico em seu estilo de vida (Jo 13). Os seus ensinos sobre a convicção da vida futura e sua doutrina são lançados a partir da realidade contextual que viviam, isto é, mesmo que passassem pela tribulação, Jesus seria para eles o exemplo maior da vitória sobre o mundo. Por isto a esperança e a certeza da vida eterna deveria satisfazê-los plenamente. (Jo 14). A necessidade da frutificação passaria pela realidade de estarem em íntima comunhão o Mestre, era como a videira e os seus discípulos os ramos. O assunto Discipulado aqui é bem explanado pelo Mestre e quanto mais fossem eles trabalhados e forjados por Deus, maiores frutos estariam dando (Jo 15).

Acima de tudo, o Discipulado tem a ver com encorajamento, o “falar ao coração” (Is 40.1,2) e o consolo, demonstrando que os discípulos deveriam esperar a consumação final. A esperança viva que os aguardava, encheria os seus corações de destemor, pois o Consolador seria dado a eles. Jesus nunca jamais os abandonaria.

Mas o Discipulado de Jesus não apenas tratava de questões relacionais ou questões da vida. O Discipulado do Mestre visava também proteção. O outro aspecto do Discipulado era o que podemos chamar de Doutrinação. Mesmo quando ele se separa das multidões, o treinamento especial era oferecido aos discípulos de maneira bem privada. O sermão do monte, por exemplo, é o reflexo disto. Durante todo este ensino específico Jesus trata também de doutrinar seus discípulos até mesmo em relação aos falsos mestres e falsos profetas. (Mt 7.15-20)

Outra questão tratada por Jesus freqüentemente era acerca da Cruz no plano de Deus, e que esta seria uma realidade na vida do Mestre e de seus discípulos. Tomar a Cruz era a resposta do crente para o mundo. Vários textos enfatizam o tomar a cruz e morrer para o mundo. Lucas 9.14, registra as palavras do Mestre como sinal de que o discípulo verdadeiro seria aquele que tomaria a sua cruz, assim como Mestre e determinantemente morreria pelos seus ideais. No mesmo evangelho no capítulo 14, versos 25 a 33, Jesus orienta seus discípulos quanto “as despesas” que os mesmos teriam com respeito ao Discipulado, e que o compromisso com Ele, começaria quando houvesse a renúncia e a doação de suas vidas em favor do reino de Deus. Portanto, dentro do plano divino, a cruz viria somente depois que seu Filho tivesse preparado homens para proclamar as boas novas de salvação ao mundo. Com isto, Jesus gasta três anos e meio para treinar e discipular pessoalmente aqueles que ficariam para dar continuidade a seu ministério.

Acima de tudo Jesus discipula com a Vida. Jesus sabia que sua vida exemplar seria tão importante quanto as suas palavras. O viver de Jesus era para os discípulos o fator preponderante para os incitar ao compromisso. As altas exigências, bem como sua própria maneira de viver marcaria profundamente a vida daqueles homens. Quando observamos toda a vida e obra de Cristo, chegamos a conclusão que todos os objetivos de Jesus foram alcançados. Contudo Lawrence Richards afirma que uma das propostas de Cristo dentro do Discipulado era a “comunicação de semelhança” (Lc 6.40). O mesmo acontecerá com a vida de seus seguidores e com a igreja cristã primitiva posteriormente.

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Continua nos próximos dias...

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Fonte: Monergismo

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Crer afeta o testemunho - Por Rev. Ericson Martins


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Nunca a Igreja protestante teve tanto acesso ao conhecimento da Teologia, se servindo de pregadores bem qualificados para o ensino das Escrituras, Conferências comprometidas com a boa reflexão e literatura especializada em quase todos os assuntos doutrinários. No entanto, percebemos que apesar de todo esse conhecimento disponível a Igreja vem sofrendo a cada dia mais com os escândalos morais, falsos mestres, heresias e práticas nada bíblicas nos cultos e na sociedade.

Perguntamos: Há falta de compreensão da boa doutrina bíblica para que a Igreja ande conforme lhe é exigida pelas Escrituras? Cremos que não! O que falta é obediência a Deus.

Esta mensagem baseada em João 12:37-46 é um chamamento àqueles que verdadeiramente creem em Jesus, para viverem uma vida de compromisso público com Ele, testemunhando a luz a todos quantos se encontram perdidos. 

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Orando pela nação?


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Meu amigo cristão, a sua igreja faz orações “pela nação”, supostamente “para que Deus ilumine as nossas autoridades”? Deus não responde tais orações.

E isso não é opinião minha; é um fato. Faz muito tempo, décadas que oram assim nas igrejas cristãs da América Latina. E as coisas não melhoram. Não há prosperidade nem desenvolvimento; e a cada governo, a situação do povo costuma ser igual ou pior que a do governo anterior.

Essa falta de resposta de Deus carece de explicação. Sobretudo porque nós cristãos estamos dando um mau testemunho. Aquele que não é cristão tem todo o direito de perguntar: “Que aconteceu com esse seu Deus? Por que não responde? É surdo? Acaso está dormindo?”.

A explicação existe, e está na Bíblia: o problema é o sistema. A Escritura Sagrada, nos extensos e detalhados capítulos de seus cinco primeiros livros (Pentateuco ou a Lei) prescreve às nações um sistema legal e político muito específico, o governo de juízes, que hoje se pode chamar de “sistema de governo limitado”. Limitado em funções: exército e polícia, justiça, e algumas poucas obras públicas de infraestrutura. Portanto, limitado também em poderes e em dinheiro.

Como consequência lógica, a Bíblia proscreve o sistema contrário, a “monarquia” ou governo de reis, em sua modalidade ilimitada, que hoje se pode chamar de “estatismo”. Veja por exemplo o capítulo 8 do livro de 1 Samuel. Numerosas outras passagens no Antigo e Novo Testamentos confirmam o conselho de Deus às nações em questões políticas e legais: sistema de governo limitado — que é o contrário do estatismo, o governo “ilimitado”, que acumula uma infinidade de funções, poderes e dinheiro.

Porém, estatismo é o modelo de governo que temos na América Latina e, uns mais outros menos, em todos os países do mundo, adotado democrática e constitucionalmente. Desprezamos ao outro sistema. E a Bíblia diz muito clara e enfaticamente que se o povo escolhe o mau caminho, grandes calamidades sobrevirão, as quais Deuteronômio 28.15-68 descreve com detalhes; bem como o próprio capítulo 8 de 1 Samuel, que se encerra com esta sentença terrível: “Então, naquele dia, clamareis por causa do vosso rei que houverdes escolhido; mas o SENHOR não vos ouvirá naquele dia” (v. 18). Viu? “Não ouvirá”. E Deus não dá ouvidos mesmo.

2 Crônicas 7 diz que o povo pode, sim, orar pela nação, porém somente se estiver arrependido e “se voltar de seus maus caminhos”; o que nunca acontece na América Latina! Pelo contrário: vemos cada vez mais estatismo! E o cúmulo do estatismo, que é o socialismo.

Longe de provar que não há Deus, ou que Deus é surdo, o fato dele não responder prova: (1) que como soberano de sua Criação, Deus é quem dita a lei; (2) e a aplica, sem desonrar a sua Palavra-Lei; (3) e não se deixa trapacear: sua vontade se cumpre. Se um país escolhe o sistema estatista, contra a recomendação explícita de Deus às nações, acaso não há de receber as consequências claramente estabelecidas pelo rei soberano?

Para encontrar resposta favorável do Altíssimo, nossa oração deve ser acompanhada de arrependimento, por ter andado em caminhos tortuosos, e de uma súplica pela restauração ou ajuste de nossa nação.

A situação ruim da nação “impenitente”, que não se arrepende nem “endireita seus caminhos”, apesar de naufragar cada dia mais no subdesenvolvimento, corrupção e aviltamento moral, é um bom testemunho do caráter de Deus, da natureza objetiva de sua Palavra, e do valor normativo dela. Pense nisso. Leia na sua Bíblia as passagens mencionadas. Reflita.

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Sobre o autor: Alberto Mansueti é advogado e cientista político.
Fonte: El Día 
Tradução: Márcio Santana Sobrinho
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terça-feira, 24 de junho de 2014

Caio Fábio: Parece, mas não é - Por Thiago Oliveira


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Hoje foi ao ar uma entrevista com o Caio Fábio, realizada por Danilo Gentili em seu programa, o The Noite (veja aqui). O Caio foi apresentado como um dos mais polêmicos pastores, até mesmo para os evangélicos. Entenda-se polêmico por herege, e o entrevistado até assumiu isso dizendo que a acusação de heresia é resultante a sua declaração de que o Antigo Testamento caducou. Foi um papo (digamos) interessante, que girou em torno de meia-hora. A entrevista, gravada semanas antes causou um frenesi entre os seguidores do Caio, que divulgaram bastante a entrevista. Afinal, havia muito tempo que ele não tinha espaço na televisão.

Para quem não sabe ou não conheceu, o auge do ministério do Caio Fábio se deu quando ele era um ministro presbiteriano. Viajando por todo o país, lotando igrejas e auditórios, e tendo inúmeros VHS’s e CD’s com seus sermões vendidos, ele havia se tornado uma referência entre os cristãos evangélicos, sobretudo os protestantes históricos. Era uma unanimidade. Mas o Caio de outros tempos caiu, como é passível de acontecer com qualquer um de nós. A questão não foi o seu pecado, mas a forma orgulhosa de não querer ser tratado. O seu orgulho causou a sua ruína ministerial. Ferido, todavia inchado, juntou-se a outros também machucados e criou o Caminho da Graça, para acolher aqueles que se denominam desigrejados. 

Quem não sabe quem ele é fica impressionado, pois sua oratória é das melhores. Outro fator que atrai a simpatia do público são as suas denúncias aos mercadores da fé. Caio começou muitíssimo bem a entrevista. Disse algo que concordo: A igreja brasileira, no geral, é manobrada por pastores mal intencionados e despreza o ensino. Isso é notório, vide as heresias que são denunciadas aqui nesse blog. Ele bateu forte no segmento Neopentecostal, mas bater nos neopentecostais é fácil, pois quem tem um pingo de consciência sabe que suas práticas são antibíblicas. O negócio é defender e preservar a sã doutrina em meio aos heréticos e mercadológicos desvios do neopentecostalismo. E é aqui que o Caio Fábio pisa na bola, e feio.

Durante o programa, algumas bobagens foram ditas (não perderei tempo com a questão dos extraterrestres). Uma delas é que o Antigo Testamento está totalmente invalidado. Isto é uma falácia muito fácil de se resolver. Os 10 mandamentos são uma amostra de que a Lei tem uma parte observada, mesmo nós estando agora sobre a benção da nova aliança. John Piper fala muito bem acerca disto:

1- Os sacrifícios de sangue cessaram, pois Cristo cumpriu tudo para o que eles estavam apontando. Ele foi o sacrifício final, irrepetível, pelos pecados. Hebreus 9:12: “Nem por sangue de bodes e bezerros, mas por seu próprio sangue, entrou uma vez no santuário, havendo efetuado uma eterna redenção”.

2- O sacerdócio que ficava entre o adorador e Deus não existe mais. Hebreus 7:23-24: “E, na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer. Mas este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo”.

3- O templo físico cessou de ser o centro geográfico da adoração. Agora, o próprio Cristo é o centro da adoração. Ele é o “lugar”, a “tenda” e o “templo” onde encontramos Deus. Portanto, o Cristianismo não tem centro geográfico, nem em Meca, nem em Jerusalém. João 4:21-23: “Disse-lhe Jesus: Mulher, crê-me que a hora vem, em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai...Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem”. João 2:19-21: “Derribai este templo, e em três dias o levantarei...Mas ele falava do templo do seu corpo”. Mateus 18:20: “Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles”.

4- As leis alimentícias, que colocavam Israel aparte das nações, foram cumpridas e acabadas em Cristo. Marcos 7:18-19: “E ele [Jesus] disse-lhes: Assim também vós estais sem entendimento? Não compreendeis que tudo o que de fora entra no homem não o pode contaminar, porque não entra no seu coração, mas no ventre, e é lançado fora?... (Assim declarou puros todos os alimentos)”.

5- O estabelecimento da lei civil sobre a base de um povo etnicamente fixado, que foi diretamente ordenada por Deus, cessou. O povo de Deus não é mais um corpo político unificado ou um grupo étnico ou um estado-nação, mas são peregrinos e forasteiros entre todos os grupos étnicos e Estados. Portanto, a vontade de Deus para os Estados não deve ser tomada diretamente da ordem teocrática do Antigo Testamento, mas deve ser agora restabelecida de lugar para lugar e de tempo para tempo, pelos meios que correspondam ao governo soberano de Deus sobre todos os povos, e que correspondam ao fato de que a genuína obediência, enraizada como ela é na fé em Cristo, não pode ser coagida pela lei. O Estado é, portanto, fundamentado em Deus, mas não expressivo da regra imediata de Deus. Romanos 13:1: “Toda a alma esteja sujeita às potestades superiores; porque não há potestade que não venha de Deus; e as potestades que há foram ordenadas por Deus”. João 18:36: “Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos”. [1]

Estes são os pontos da Lei que não vogam, pois Cristo os cumpriu. Também não estamos mais debaixo de sua condenação. Todavia, sua moralidade não está caduca. É tanto que os apóstolos se valem dos princípios veterotestamentários para trazer ensinamento a igreja do primeiro século. Desprezar todo o Antigo Testamento é ir além do que Jesus e os seus apóstolos fizeram ou ensinaram. Em Mateus 22:37-40, os dois grandes mandamentos ensinados pelo Salvador são do Pentateuco: Levítico 19:18 e Deuteronômio 6:5. Portanto, se nós amarmos a Deus e amarmos ao nosso próximo, estamos cumprindo uma Lei do Antigo Testamento. Prova suficiente para atestar que ele não caducou, como disse o Caio Fábio.

A outra bobagem foi a de relatar uma possível contradição bíblica. Respondendo a uma questão levantada por Gentili sobre os nefilins, Caio Fábio falou sobre Ogue, rei de Basã, e disse que ele era um sobrevivente do dilúvio. O próprio Danilo ficou espantado com isso, pois disse ter aprendido que só Noé e sua família sobreviveram. E o apresentador está correto. A Bíblia é categórica: 

E toda a carne que se movia sobre a terra, tanto de aves e de gado, e de animais, e de todo réptil que se arrasta sobre a terra, e  cada homem: Tudo estava em suas narinas o fôlego da vida, tudo o que havia na terra seca, morreu.  E cada substância viva foi destruído o que havia sobre a face da terra, o homem e o gado, e os répteis e as aves do céu; e eles foram exterminados da terra, e ficou somente Noé, e os que estavam com ele na arca”. - Gênesis 7:21-23

A lenda de Ogue ter sobrevivido ao dilúvio é folclórica e não histórica. Não há bases bíblicas e arqueológicos que sustentem esta afirmação. Ademais, o Caio Fábio é conhecido por afirmar de maneira axiomática coisas que a Bíblia sequer deixa claro. A regra hermenêutica clássica é a de que a Escritura se auto interpreta. Obviamente, utilizamos recursos como documentos históricos e achados arqueológicos para fazermos uma boa exegese, no entanto estas ferramentas apenas nos servem de apoio aquilo que está biblicamente claro, sendo extremamente perigoso usar de tais recursos para tentar revelar aquilo que Deus soberanamente quis deixar encoberto aos olhos humanos.

No fim da entrevista, vemos um Caio bonachão, falando de suas experiências sexuais de uma maneira vulgar, típico de quem quer se mostrar um cara livre das amarras da religião e parecer descolado. Para atestar sua postura fala que Cristo era alguém tão boa praça que não ligava para o fato de uma pessoa ser gay ou de uma mulher ser p*t*. Este Jesus indulgente também está longe de ser o Cristo da Escritura. É bem verdade que pecadores conviveram com ele, porém todos foram transformados pela Palavra e abandonaram as práticas pecaminosas. 

É extremamente perigoso o discurso liberal do Caio Fábio. Fere a ortodoxia e estimula pessoas a abandonarem a prática de congregar como igreja. Sabemos da imperfeição da natureza humana presente na igreja visível. Só que devemos nos lembrar que a natureza divina da igreja nos levará em triunfo para a glória. E para isso deve haver perseverança no Corpo dos Santos até o fim. Sinceramente, fico triste por ver alguém com o carisma e o intelecto do Caio prestando um desserviço ao Evangelho. Ainda mais quando recordo de que ele já foi um cooperador do mesmo. Para alguns ele continua pastor. Em certo sentido até parece com um, mas não é. Eu, como um jovem aspirante ao Ministério, devo tomá-lo como exemplo de que o importante não é começar bem, mas sim, terminar bem. Tal como Paulo, antes perseguidor da Igreja, tornou-se o principal divulgador do cristianismo e disse convincentemente: 

Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé”. - 2 Timóteo 4:7

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Nota:

[1] - John Piper - Como Cristo Cumpriu e Acabou com o Regime do Antigo Testamento

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segunda-feira, 23 de junho de 2014

A soberania de Deus: uma doutrina prática e preciosa - Por John Piper


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Usufruindo da soberania de Deus na vida de George Müller

Um dos grandes deleites de ministrar em uma igreja durante vinte anos é que você pode ver as pessoas atravessarem as épocas obscuras da vida, dependendo da bondade soberana de Deus e chegando ao outro lado com fé e gozo inabaláveis. A soberania de Deus é uma doutrina muito preciosa. É o caule vigoroso da árvore que impede que a nossa vida seja abalada pelos ventos da adversidade. É a rocha que se ergue para nós em meio ao dilúvio de incerteza e confusão. É o olho do furacão no qual permanecemos firmes com Deus, olhando para o céu azul de sua maestria, quando tudo está sendo destruído. Conheço um hino que diz: “Quando tudo ao redor de minha alma desaparece”, isto é a minha esperança e firmeza.

A palavra “soberania”, tal como a palavra “trindade”, não ocorre na Bíblia. Estou usando-a para referir a esta verdade: Deus está no controle do mundo, desde o conflito internacional mais amplo até à queda de um pequeno pássaro na floresta. Eis como a Bíblia apresenta a soberania de Deus: “Lembrai-vos das coisas passadas da antiguidade: que eu sou Deus, e não há outro, eu sou Deus, e não há outro semelhante a mim; que desde o princípio anuncio o que há de acontecer e desde a antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho permanecerá de pé, farei toda a minha vontade” (Isaías 46.9-10). “E, segundo a sua vontade, ele [Deus] opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que fazes?” (Daniel 4.35) “Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai” (Mateus 10.29) “O que ele deseja, isso fará. Pois ele cumprirá o que está ordenado a meu respeito e muitas coisas como estas ainda tem consigo” (Jó 23.13-14). “No céu está o nosso Deus e tudo faz como lhe agrada” (Salmos 115.3). “Aquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Efésios 1.11). “Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão” (Romanos 9.15). “Devíeis dizer: Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos isto ou aquilo” (Tiago 4.15).

Uma das razões por que esta doutrina é tão preciosa para os crentes é o fato de sabermos que o grande desejo de Deus é mostrar misericórdia e bondade para aqueles que confiam nEle. “Farei com eles aliança eterna, segundo a qual não deixarei de lhes fazer o bem; e porei o meu temor no seu coração, para que nunca se apartem de mim. Alegrar-me-ei por causa deles e lhes farei bem... de todo o meu coração e de toda a minha alma” (Jeremias 32.40-41). A soberania de Deus significa que o desígnio dEle a nosso respeito não pode ser frustrado. Nada, absolutamente nada, acontecerá àqueles que Deus ama e que são chamados segundo o seu propósito, exceto o que lhes for profundo e altamente bom. (Romanos 8.28; Salmos 84.11).

Por isso, a misericórdia e a bondade de Deus são os dois pilares de minha vida. São a esperança de meu futuro, a energia de meu serviço, o centro de minha teologia, o vínculo de meu casamento, o melhor remédio para todas as minhas enfermidades, o fortificante de todos os meus desencorajamentos. E, quando eu morrer (em breve ou não), essas duas verdades estarão à minha cabeceira e, com mãos infinitamente fortes e carinhosas, me erguerão à presença de Deus.

George Müller tem sido admirado por cento e cinqüenta anos como um grande homem de fé, por causa das obras que realizou, especialmente os orfanatos em Londres. Nem todos sabem que ele viveu de um modo maravilhoso, em completa dependência da preciosa verdade da soberania de Deus. Quando faleceu a sua esposa, com a qual estava casado havia trinta e nove anos, Müller pregou o sermão do funeral com base no texto de Salmos 119.68: “Tu és bom e fazes o bem”. Ele conta como orou quando descobriu que ela estava com febre reumática:

Sim, meu Pai celestial, os dias de minha querida esposa estão em tuas mãos. Tu farás o que é melhor para ela e para mim, quer seja a vida, quer seja a morte. Se quiseres, restaura a saúde de minha preciosa esposa. Tu és capaz de fazer isso, embora ela esteja tão doente. Mas o que fizeres comigo somente me ajudará a continuar a ser perfeitamente satisfeito com tua santa vontade (Autobiography of George Müller, London: J. Nisbet and Co., 1906, p. 442).

A vontade de Deus foi levá-la. Portanto, com grande confiança na soberana misericórdia de Deus, Müller disse:

Eu aceito. Estou satisfeito com a vontade de meu Pai celestial. Busco perfeita submissão à sua vontade santa, para glorificá-Lo. Honro constantemente Aquele que me afligiu... Sem qualquer esforço, minha alma se regozija na felicidade da amada que partiu. A felicidade dela me dá regozijo... Deus mesmo o fez; estou satisfeito com Ele (Autobiography, p. 444, 440).

Isto expressa a preciosidade da doutrina da soberania de Deus.

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Fonte: desiringGod

Leia mais sobre George Müller aqui!
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domingo, 22 de junho de 2014

Agora gays podem casar na Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos (PCUSA)


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No dia 19 deste mês (Junho de 2014) a Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos (PCUSA) aprovou com maioria folgada uma alteração na sua Constituição. Em vez de dizer “o casamento é entre um homem e uma mulher,” a Constituição da PCUSA agora diz “o casamento é entre duas pessoas”. Obviamente, a alteração foi feita para poder acomodar dentro da PCUSA os gays que querem casar na igreja e ter cerimônia religiosa realizada por pastores/pastoras presbiterianos.

Esse é mais um passo na direção da apostasia, desde que a PCUSA entrou pelo caminho do liberalismo teológico. Veja a notícia aqui

Antes de mais nada, preciso esclarecer que essa denominação norte-americana nada tem a ver com a Igreja Presbiteriana do Brasil. Na verdade, a IPB tem consistentemente rechaçado nas últimas décadas todas as tentativas oficiais de aproximação com PCUSA, feitas tanto das bandas de lá como das bandas de cá. É injusto colocar todos os presbiterianos no mesmo saco em que esta denominação apóstata se meteu. Ela traiu sua herança presbiteriana e o que é mais importante, traiu o Cristianismo bíblico.

Não vou dizer que fiquei estarrecido, surpreso ou chocado com a decisão tomada finalmente pela assembléia geral da PCUSA. Não estou surpreso porque já era de se esperar que tal coisa acontecesse, cedo ou tarde. Afinal, as decisões que vinham sendo tomadas por esta denominação presbiteriana em décadas recentes, não poderiam levar a outra coisa senão a decisões como tais. A decisão de aceitar casamento gay como sendo cristão é o resultado da fermentação de vários conceitos e pressupostos que ao longo do tempo foram lentamente sendo introduzidos na alma da denominação, formando irreversivelmente a sua maneira de pensar e de agir.

Tudo começou quando a PCUSA passou a tolerar que o liberalismo teológico fosse ensinado nas suas instituições teológicas, as quais são responsáveis pela formação teológica, eclesiástica e ministerial dos seus pastores. O liberalismo teológico retira toda a autoridade das Escrituras como palavra de Deus, introduz o conceito de que ela é fruto do pensamento ultrapassado de gerações antigas e que traz valores e conceitos que não podem mais ser aceitos pelo homem moderno. Assim, coloca a Bíblia debaixo da crítica cultural. O passo seguinte foi a aprovação da ordenação de mulheres cristãs ao ministério, em meados da década de 60, com base exatamente no argumento de que os textos bíblicos que impõem restrições ao exercício da autoridade eclesiástica por parte da mulher cristã eram culturalmente condicionados, e portanto impróprios para a nossa época, em que a mulher já galgou todas as posições de autoridade.

O argumento que vem sendo usado há décadas pelos defensores do homossexualismo dentro da PCUSA segue na mesma linha. Os textos bíblicos contrários ao homossexualismo são vistos como resultantes da cosmovisão cultural ultrapassada dos escritores bíblicos, refletindo os valores daquela época. Em especial, os textos de Paulo contra o homossexualismo (Romanos 1 em particular) são entendidos como condicionados pelos preconceitos da cultura antiga e pela falta de conhecimento científico, que segundo os defensores do homossexualismo hoje já demonstra que ser gay é genético, não podendo, portanto, ser mais considerado como desvio moral ou pecado. Já que a cultura moderna mais e mais aceita o homossexualismo como normal, chegando mesmo a reconhecer o casamento entre eles em alguns casos, por que a Igreja, que deveria sempre dar o primeiro exemplo em tolerância, aceitação e amor, não pode receber os homossexuais como membros comungantes e pastores da Igreja? Essa foi a argumentação que finalmente prevaleceu, pois a decisão permite que homossexuais praticantes considerem a sua escolha sexual como uma questão secundária e não como matéria de fé, sujeita à disciplina eclesiástica da denominação.

Não estou dizendo que todos os que defendem a ordenação de mulheres necessariamente são defensores da ordenação gay e do casamento de homossexuais. Tenho bons amigos que defendem um e abominam o outro. Estou apenas dizendo que, em ambos os casos, o argumento usado para sua aprovação dentro da PCUSA foi o mesmo: o que os escritores bíblicos dizem sobre estes assuntos não tem validade para os dias de hoje, e portanto, a Igreja deve se guiar por aquilo que é culturalmente aceitável, politicamente correto e que faz parte do bom senso comum.

Existe uma brava minoria dentro da PCUSA que, de longa data, tem lutado contra a introdução desses conceitos. Agora, assiste com tristeza a derrota bater à sua porta. Desde que a PCUSA aceitou o homossexualismo, mais de 10.000 igrejas já saíram dela. Esta que já foi a maior denominação presbiteriana do mundo hoje está reduzida a 1,8 milhões de membros. E este número cai mais a cada ano. 

Não devemos pensar que esse é um problema que se restringe àquela denominação americana. Os mesmos pressupostos que a levaram a tomar essa decisão já estão em operação em nosso país, a começar pelos seminários e instituições de ensino teológico que já caíram vítimas do método histórico-crítico de interpretação, do liberalismo teológico, do pragmatismo e do relativismo. O campo está sendo preparado no Brasil para que em breve evangélicos passem a considerar a homossexualidade como sendo uma questão pessoal e secundária, abrindo assim a porta para ordenação de gays e lésbicas praticantes ao ministério da Palavra e para a realização de casamento gay nas igrejas evangélicas.

Acredito que a única medida preventiva é não abrirmos mão da legitimidade e aplicabilidade dos valores e dos ensinamentos bíblicos para todas as épocas e culturas. Isto nos permitirá sempre fazer uma crítica da cultura a partir do referencial da Palavra inspirada e infalível de Deus. Foi quando a PCUSA subjugou a Bíblia à cultura que a lata de minhocas foi aberta. A Bíblia passou a ser julgada pela cultura. Vai ser difícil para liberais, neo-ortodoxos, libertinos e outros grupos no Brasil, que de maneiras diferentes colocam a cultura à frente da Bíblia, resistir à pressão. Quem viver, verá.

Mais artigos sobre o assunto aqui no blog Tempora-Mores:

• PCUSA prestes a se dividir
• Decepcionados com ordenação de homossexuais, presbiterianos deixam a denominação (PCUSA) em massa
• Denominação Americana Finalmente Aprova Pastores Homossexuais Praticantes
• Por Quê Igrejas Presbiterianas pelo Mundo estão Aceitando Pastores Homossexuais?

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Fonte: O Tempora! O Mores!
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sábado, 21 de junho de 2014

A Bíblia é inspirada, confiável e inerrante


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A Bíblia gera muitos questionamentos e controvérsias. Muitos sempre perguntam se ela é mesmo a Palavra de Deus e argumentam que por ter sido escrita por homens, pode ter sido alterada ao longo da História. Mas então, a Bíblia é de fato a Palavra de Deus? Podemos confiar nela? Não seria ela uma obra possuidora de muitos erros? Para chegarmos a uma resposta satisfatória, devemos analisar três correntes teológicas: Liberalismo, Neo-Ortodoxia e Teologia Reformada.

O Liberalismo Teológico tem ligação com o método histórico-crítico de interpretação bíblica. Este método nega a inspiração divina e reduz as Escrituras a um compêndio da fé israelita e dos primeiros cristãos, recheado de erros e contradições. Influenciado pelo Iluminismo, o Liberalismo adquiriu um caráter antropocêntrico e relativizou questões-chaves da dogmática. Schleiermacher foi o grande expoente dessa corrente que se afastou a passos largos do ensino ortodoxo e fez com que a Igreja europeia abraçasse o mundanismo e declinasse para o Cristianismo secularizado que até hoje é uma de suas marcas.

Todavia, com o advento da Primeira Guerra Mundial, todo o ideal progressista-iluminista foi por água abaixo. As correntes de pensamento entram em crise e a Teologia não foge à regra. É justamente neste cenário que surge Karl Barth com o que chamamos de Neo-Ortodoxia ou Barthianismo. A Neo-Ortodoxia lutou contra a secularização da Igreja e defendeu que a Bíblia é a palavra de Deus revelada aos homens. 

O grande problema da corrente Neo-Ortodoxa é que ela conservou a crítica bíblia do Liberalismo, a mesma que reduziu as Escrituras a um livro de fé comum. A diferença é que os barthianos afirmam que mesmo contendo erros, a Bíblia é a Voz de Deus para a humanidade. Para sustentar essa posição, argumentam que a parte histórica é irrelevante para a fé salvífica, sendo assim, pouco importa a veracidade dos relatos bíblicos sobre a Queda, o Dilúvio, o Cativeiro Egípcio e etc.

Para a Teologia Reformada (evangélica/protestante) a Bíblia é a Palavra de Deus em sua totalidade e está isenta de erros. Desde o século XVI, de Lutero até os dias de hoje, cristãos de confissão reformada adotam o Sola Scriptura como ponto crucial da fé. Calvino (2006, p.72), o grande sistematizador da doutrina reformada fala o seguinte quanto ao questionamento da procedência divina das Escrituras:

Se, pois, quisermos firmar a nossa consciência de modo que não permaneça agitada e em perpétua dúvida, é preciso que coloquemos a autoridade da Escritura muito acima das razões ou das circunstâncias ou das conjecturas humanas; quer dizer, é preciso que a estabeleçamos como base no testemunho do Espírito Santo. Porque, ainda que, por sua própria majestade, a Escritura nos leve a respeitá-la, não obstante só começa a tocar-nos quando é selada em nosso coração pelo Espírito Santo. [...] É graças à certeza dada por uma autoridade superior que concluímos, que, sem dúvida nenhuma, a Escritura nos foi outorgada diretamente por Deus.

Com isso, Calvino defende que por ser um livro de revelação, a Bíblia precisa ser revelada a nós através de uma ação soberana do próprio Deus, na pessoa do Espírito. O mesmo processo revelacional ocorreu com os autores bíblicos que passaram por um processo de inspiração para deixar registrada a Palavra de Deus como uma fonte revelacional permanente e completa, ao ponto de não mais haver a necessidade de uma outra (i.é. nova) revelação. Tudo o que precisamos saber sobre Deus está registrado nos escritos do Antigo e do Novo Testamento. Assim, o primeiro questionamento (a Bíblia é de Fato a Palavra de Deus?) está respondido.

Dizer que a Bíblia é um livro inspirado é estar de acordo com que a mesma diz acerca de si própria (2Tm 3:16). No entanto, a inspiração não foi um ditado divino. Deus usou as características humanas de cada autor para dizer aquilo que deveria ser dito. Muitos fazem confusão com esta informação e dizem que se existe este viés de humanidade no processo de escrituração e o erro é inerente da condição humana, logo, existe a possibilidade de ter erros na Bíblia. Barth é um exímio defensor do errare humanum est. Embora isto seja verdade, não quer dizer que os homens erram sempre em tudo que fazem, muito menos concluir que o erro é necessário ao homem.

O homem é limitado por ser finito, porém a finitude não o torna falível sempre. Há de se separar onisciência de infalibilidade. Estas duas coisas estão conjuntas em Deus, não nos homens. Como afirma Sproul (2012, p. 49): “Finitude significa uma necessária limitação de conhecimento, mas não significa obrigatoriamente uma distorção do conhecimento. A confiabilidade do texto bíblico não deve ser negada com base na finitude do homem”.

Respondendo ao questionamento sobre a confiabilidade bíblica, sobretudo do Novo Testamento, o mais questionado, apelamos para dois argumentos bastante convincentes:

• Argumento Bibliográfico: Corresponde a lacuna do tempo histórico em que o livro foi escrito e o manuscrito mais antigos que temos dele. Por exemplo: O manuscrito da obra de Platão mais antigo que temos data de 1200 anos após o filósofo grego ter escrito o original. Aristóteles também escreveu 1400 anos antes da cópia mais antiga que possuímos dele. Já o intervalo do original para a cópia de um livro do NT é de apenas 100 anos, e temos esta certeza graças a descoberta arqueológica do papiro de John Rylands.
 Argumento Manuscritológico: Corresponde a quantidade de cópias de um presumível texto original. Quanto maior a quantidade de cópias, maiores são as chances de identificar as imprecisões. Por exemplo: Temos sete cópias manuscritas de Platão em todo o mundo. De Aristóteles temos apenas cinco cópias. Em contrapartida, contando apenas as cópias gregas, o texto do Novo Testamento é preservado em aproximadamente 5.686 porções manuscritas parciais e completas que foram copiadas a mão a partir do século I até o século XV.

Além dos manuscritos gregos, há várias traduções partindo do grego. Contando com as principais traduções antigas em aramaico, copta, árabe, latim e outras línguas, há 9 mil cópias do Novo Testamento. Isso dá um total de mais de 14 mil cópias do Novo Testamento. Além disso, se compilarmos milhares de citações dos pais da igreja primitiva dos séculos II a IV pode-se reconstruir todo o Novo Testamento com exceção de onze versículos. De modo que se não for possível confiar na Bíblia, também deve ser posto em xeque a autenticidade de toda e qualquer obra literária da Antiguidade. 

Quanto a questão dos erros, o segmento reformado é categórico: Toda a Bíblia é inerrante. Lopes (2006) diz:

Ao dizer que a Bíblia é inerrante, não estou negando que erros de copistas se introduziram no longo processo de transmissão da mesma. A inerrância é um atributo somente dos autógrafos, ou seja, do texto como originalmente produzido pelos autores inspirados por Deus. Muito embora hoje não tenhamos mais os autógrafos, pela providência divina podemos recuperar seu conteúdo, preservado nas cópias, quase que totalmente, através da ajuda de ferramentas como a baixa crítica ou a manuscritologia bíblica. A ausência dos autógrafos não torna a inerrância bíblica irrelevante, como dizem alguns. Senão temos os autógrafos para provar que eles não contêm erros, eles também não os têm para provar que contêm. Lembro que o ônus da prova é deles.

Alguns objetam com passagens bíblicas que falam sobre o movimento do sol em Josué e de catalogar morcego como ave, segundo Levítico, como se tais exemplos fossem equívocos de cunho científico. Recomemos mais uma vez as palavras de Lopes (2006):

Ao afirmar a inerrância da Bíblia não estou ignorando que, com freqüência, as teorias científicas sobre a história da terra têm sido usadas para desacreditar o relato bíblico da criação, do dilúvio e sua cosmovisão geocêntrica. Entendo, contudo, que não é correto avaliar a veracidade da Bíblia mediante padrões de verdade que são distintos do seu propósito e que se baseiam em conclusões provisórias, efêmeras e freqüentemente desmentidas a posteriori por outros estudiosos e cientistas. A Bíblia não é um livro científico, nos padrões modernos, e frequentemente se refere aos fenômenos naturais usando a linguagem descritiva do observador, como já mencionei, a qual não é cientificamente analítica.

Como observadores dos fenômenos naturais, é totalmente aceitável que haja esse tipo de informação na Bíblia. Em qualquer registro do mundo antigo teremos pessoas falando sobre o movimento do sol e catalogando animais voadores como sendo aves. Até mesmo nos filósofos gregos encontramos estas afirmações, que hoje nos soam absurdas. Todavia, inaceitável seria se naquela época eles tivessem as informações científicas que hoje temos.

Mediante a tudo o que já foi exposto, a Bíblia taxativamente provém de Deus, sendo a Sua Palavra digna de confiança e inerrante. Mesmo utilizando-se de um processo humano, ela é inspirada em sua totalidade. Assim rechaçamos o posicionamento liberal e o barthiano. Esta é a posição ortodoxa, abraçada pelas igrejas de credo reformado. Como está registrado na Confissão de Fé de Westminster Capítulo 1, artigo V:

Pelo testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente apreço da Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, e eficácia da sua doutrina, a majestade do seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu todo (que é dar a Deus toda a glória), a plena revelação que faz do único meio de salvar-se o homem, as suas muitas outras excelências incomparáveis e completa perfeição, são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser ela a palavra de Deus; contudo, a nossa plena persuasão e certeza da sua infalível verdade e divina autoridade provém da operação interna do Espírito Santo, que pela palavra e com a palavra testifica em nossos corações. I Tim. 3:15; I João 2:20,27; João 16:13-14; I Cor. 2:10-12.
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Referências:
BEEKE, Joel R. Harmonia das Confissões Reformadas. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2006.
CALVINO, João. As Institutas. São Paulo: Volume 1, Editora Cultura Cristã,2006.
LOPES, Augustus Nicodemus. Sobre a Inerrância da Bíblia. Acesso em 20/06/2014.
LOPES, Augustus Nicodemus. Porque o Barthianismo foi Chamado de Neo-Ortodoxia. Acesso em 20/06/2014.
SPROUL, R.C. Posso Crer na Bíblia? São José dos Campos: Editora Fiel, 2012.
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Divulgação: Bereianos

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Por que não há mais apóstolos hoje? Por Rev. Augustus Nicodemus Lopes


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Em sua polêmica contra os escribas e fariseus, Jesus de certa feita se referiu a seus apóstolos como aqueles que, à semelhança dos profetas, sábios e escribas enviados por Deus ao antigo Israel, seriam igualmente enviados, rejeitados, perseguidos e mortos (Lc 11.49 com Mt 23.34). Desta forma, ele estabelece o paralelo entre os apóstolos e os profetas como enviados de Deus ao seu povo.

Tem sido observado que os sucessores dos profetas do Antigo Testamento, como Isaias, Jeremias, Ezequiel, Daniel e Amós, por exemplo, não foram os profetas do Novo Testamento, que tinham ministério nas igrejas locais, mas os apóstolos de Jesus Cristo, mais especificamente os doze e Paulo.[1]

Conforme já vimos acima, os profetas foram diretamente vocacionados e chamados por Deus (cf. Is 6.1-9; Jr 1.4-10; Ez 2.1-7; Am 7.14-15). A palavra mais usada para “profeta” no Antigo Testamento  (nabi), que transmite o conceito de alguém que fala por outro, como “sua boca” (Ex 4.16; 7.1; cf. ainda Dt 18.14-22). O profeta era, então, primariamente, alguém que falava da parte de Deus, inspirado e orientado por ele. Os profetas falaram ousadamente da parte dele sua mensagem ao povo de Israel (Lc 1.70; Hb 1.1-2). Parte destas profecias veio a ser escrita e registrada no Antigo Testamento, que é chamado por Paulo de “escrituras proféticas” (Rm 16.26, cf. ainda 2Pe 1.21; 2Tm 3.16).[2] Notemos que a mensagem dos profetas não consistia apenas da predição de eventos futuros relacionados com a ação de Deus na história, os quais se cumpriram infalivelmente (Dt 18.20-22; cf. 1Rs 13.3,5; 2Rs 23.15-16). A mensagem deles consistia, em grande parte, na exposição desses eventos e sua aplicação aos seus dias. Os profetas introduziam suas palavras com as fórmulas “assim diz o Senhor” e “veio a mim a Palavra do Senhor dizendo,” o que identificava sua mensagem como inspirada e infalível. Como tal, deveria ser recebida pelo povo de Deus como a própria palavra do Senhor.

A literatura intertestamentária produzida pelos judeus nos séculos depois de Malaquias considerava que o ministério desses profetas encerrou-se com Malaquias.[3] Da mesma forma, os escritores do Novo Testamento se referem aos profetas antigos como um grupo fechado e definido (cf. Mt 23.29-31; Mc 8.28; etc.). A pergunta é: através de quem Deus continuou a se revelar? Quem foram os sucessores dos profetas do Antigo Testamento como receptores e transmissores da Palavra de Deus? Resta pouca dúvida de que foram os doze apóstolos e o apóstolo Paulo, e não os profetas cristãos das igrejas locais, como aqueles que haviam em Jerusalém, Antioquia e Corinto, por exemplo (At 11.27; 13.1; 1Co 14.29). Ao contrário do que ocorria no Antigo Testamento, profetizar, na igreja cristã nascente, era um dom que todos os cristãos poderiam exercer no culto, desde que seguindo uma determinada ordem (1Co 12.10; 14.29-32). E, diferentemente dos grandes profetas de Israel, as palavras dos profetas cristãos tinham de ser julgadas pelos demais (1Co 14.29) e eles estavam debaixo da autoridade apostólica (1Co 14.37).

Em contraste com os profetas cristãos, os apóstolos  do Novo Testamento, isto é, os doze e Paulo, receberam uma chamada específica de Jesus Cristo, receberam revelações diretas da parte de Deus, como os antigos profetas (At 5.19-20; 10.9-16; 23.11; 27.23; 2Co 12.1), e assim predisseram futuros eventos relacionados com a história da salvação, entre os quais a segunda vinda do Senhor, a ressurreição dos mortos e o juízo final – isso não quer dizer que sua chamada se deu porque tinham o “dom” de apóstolo. (1Co 15.51-52; 2Ts 2.1-12; 2Pe 3.10-13).[4] Lembremos que o livro de Apocalipse é uma profecia (ver Ap 1.3; 22.18-19) escrita por um apóstolo.[5] Ao contrário dos profetas cristãos das igrejas locais, que não deixaram nada escrito, os apóstolos foram inspirados para escrever o Novo Testamento (1Ts 2.13; 2Pe 3.16) e a palavra deles deveria ser recebida, à semelhança dos profetas antigos, como Palavra de Deus, sem questionamentos, ao contrários dos profetas das igrejas locais (Gl 1.8-9; 1Co 14.37). Os autores neotestamentários que não foram apóstolos, como Marcos, Lucas, Tiago e Judas eram, todavia, parte do círculo apostólico e associados aos apóstolos, escrevendo a partir do testemunho deles.[6]

Como sucessores dos profetas de Israel e canais da revelação, os apóstolos aparecem juntos com eles na base da igreja. Nas palavras de Jesus, “Enviar-lhes-ei profetas e apóstolos, e a alguns deles matarão e a outros perseguirão” (Lc 11.49). Paulo junta os dois grupos duas vezes na carta aos Efésios como aqueles designados por Deus para lançar as bases da igreja; “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas” (Ef 2.20); “o qual, em outras gerações, não foi dado a conhecer aos filhos dos homens, como, agora, foi revelado aos seus santos apóstolos e profetas, no Espírito” (Ef 3.5). Muitos estudiosos entendem que os “profetas” mencionados nestas duas passagens de Efésios são profetas das igrejas neotestamentárias, que vieram depois dos apóstolos. Todavia, mesmo estando numa sequência temporal invertida, “profetas” se entende melhor como os grandes profetas de Israel, que vieram antes dos apóstolos. A sequência “apóstolos e profetas” não precisa ser entendida como uma sequência temporal. Os apóstolos são mencionados primeiro por estarem no foco do contexto.[7]

Em sua segunda carta, Pedro admoesta seus leitores a se recordarem tanto das palavras que foram ditas pelos “santos profetas” como do mandamento ensinado por “vossos apóstolos” (2Pe 3.2). Alguns entendem que “vossos apóstolos” aqui é uma referência aos missionários pioneiros que haviam fundado as igrejas às quais Pedro escreve. Contudo, a carta de Pedro não foi destinada a igrejas locais específicas e sim aos cristãos em geral (cf. 2Pe 1.1). O único grupo de “apóstolos” que se encaixaria como “vossos apóstolos” seriam os doze, que eram apóstolos para todas as igrejas.[8] A carta de Judas, cuja similaridade com a segunda carta de Pedro tem levado estudiosos a acreditarem numa dependência literária entre elas,[9] ao se referir aos apóstolos neste mesmo contexto, designa-os como “os apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo,” numa clara referência ao grupo dos doze (Jd 17).[10] Estas passagens refletem a consciência de que os apóstolos de Jesus Cristo foram os continuadores dos profetas do Antigo Testamento como canais pelos quais Deus revelou sua vontade.[11]

Uma vez que a revelação de Deus quanto ao plano da salvação foi totalmente escrita e registrada de maneira final, completa e infalível pelos apóstolos, no Novo Testamento, completando assim a revelação dada através dos profetas de Israel no Antigo Testamento, encerrou-se o ministério de ambos os grupos.

Já que os apóstolos foram os sucessores dos profetas do Antigo Testamento, não há, pois, hoje, possibilidade de haver apóstolos como os doze e Paulo, pois eles foram recipientes e transmissores da revelação final de Deus para seu povo, que se encontra registrada no Novo Testamento.

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Notas:
[1] Cf. Heber Carlos de Campos, “Profecia Ontem e Hoje” em Misticismo e Fé Cristã (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2013), pp. 63-126; Christiaan J. Beker, Paul the Apostle - The Triumph of God in Life and Thought (Philadelphia: Fortress Press, 1980), p. 113.
[2] Alguns estudiosos, como E. E. Ellis, sugerem que “escrituras proféticas” é uma alusão de Paulo a escrituras que haviam sido produzidas por profetas neotestamentários, escritos estes que haviam circulado pelas igrejas, mas nunca foram preservados (E. Earle Ellis, The Old Testament in Early Christianity em WUNT, 54 [Tübingen: Mohr/Siebeck, 1991], 4-5; E. Earle Ellis, Pauline Theology: Ministry and Society [Grand Rapids: Eerdmans; Exeter: Paternoster Press, 1989], 138 n. 79). Todavia, Cranfield corretamente considera esta interpretação de Ellis como “desesperada” (C. E. B. Cranfield, A Critical and Exegetical Commentary on the Epistle to the Romans, 2 vols, em International Critical Commentary[Edinburgh: T. & T. Clark, 1979], 2:811, n.8).