segunda-feira, 31 de março de 2014

O Propósito do Sexo no Casamento - Por Leland Kyken






Os Puritanos também tinham uma teoria totalmente desenvolvida sobre os propósitos do sexo e do casamento. O contexto mais amplo em que devemos colocar seus comentários é a tradição protestante unificada que incluía tanto anglicanos como Puritanos. Enquanto autores individuais podem modificar o esquema, a estrutura geral era uma finalidade tríplice para o casamento, ou seja, procriação, um remédio contra o pecado sexual e uma sociedade mútua.
A contribuição distintiva dos Puritanos dentro desta estrutura foi mudar a ênfase primária da procriação para o companheirismo.
A ordem adotada no Livro de Orações Comuns foi (1) a procriação de filhos, (2) a restrição e remédio do pecado, e (3) sociedade, ajuda e conforto mútuos. James Johnson escreveu um capítulo inteiro para mostrar que à medida que se desenvolveu o pensamento Puritano, o primeiro e terceiro propósitos do casamento mudaram de lugar na lista do Livro de Orações. Johnson fornece numerosas citações dos Puritanos, as quais não tenho espaço para reproduzir, mas este resumo vale a pena ponderar:
É o resultado da ênfase Puritana sobre o companheirismo no casamento que faz a primeira e última razões mudarem de lugar. Outra maneira de dizer isto é observar que os Puritanos normalmente consideram um versículo do segundo capítulo de Gênesis – “Disse mais o Senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea” ao invés daquele normalmente citado do primeiro: “Sede fecundos, multiplicai-vos” – para sua explicação sobre por que o casamento foi instituído por Deus em primeiro lugar.1
Na doutrina católica, a única coisa que havia salvo o sexo no casamento era a procriação de filhos. Os Puritanos discordaram. Perkins afirmou que “alguns escolásticos erram ao sustentar que a união secreta do homem e da mulher não pode ser pecado a menos que seja feita para a procriação de filhos”.2 Isto é semelhante à opinião de Milton de que:
Deus na primeira ordenação do casamento nos ensinou para que fim o fez,... para confortar e refrescar o homem contra o mal da vida solitária, não mencionando a finalidade de geração até mais tarde.3
Se a principal finalidade do sexo no casamento é a expressão de amor e companheirismo mútuos, é uma perversão do sexo reduzi-lo a um ato meramente físico. “Como podemos dois... tornar-se uma só carne legalmente”, indagou Clever, “quando existe a falta de união e conjunção do coração, a mãe verdadeira e natural de todos os deveres do casamento?”4 Perkins tinha algo semelhante em mente quando escreveu: “Nada é mais vergonhoso do que amar uma esposa como se ela fosse uma prostituta.”5 E Milton escreveu:
Embora a copulação seja considerada entre os fins do casamento, entretanto o ato em si numa correta avaliação não pode ser mais matrimonial do que é um efeito do amor conjugal. Quando o amor... Se desvanece,... o ato carnal de fato pode continuar, mas não santo, não puro, não apropriado ao sagrado laço do matrimônio, sendo quando muito nada mais que uma excreção animal.6_________________
Transcrito do livro “Santos no Mundo”, Leland Ryken, Editora Fiel, pág 62,63
1 James Johnson, p. 114. Johnson também observa que “exaltar o companheirismo acima da procriação não significa para o Puritano que a procriação tem menos lugar no casamento. Ao contrário, de um casamento cristão se espera que produza descendentes como da vida sociável” (p. 116).
2 Christian Economy [James Johnson, p. 68].
3 The Doctrine and Discipline of Divorce [ CPW, 2:235]. Lutero havia semelhantemente escrito: “A propagação não está em nossa vontade ou poder, pois pais nenhuns são capazes de prever se eles... darão à luz um filho ou uma filha. Meu pai e minha mãe não consideraram que queriam trazer um Dr. Martinho Lutero ao mundo. A criação é de Deus somente e nós não somos capazes de percebe-la” (Tischreden [Roland Bainton, What Christianity Says About Sex, Love, and Marriage (Nova York, Association, 1957), p. 79]). Lawrence Stone, Family, conclui que “teólogos protestantes de todas as persuasões haviam há muito identificado o conforto mútuo e o apreço como duas finalidades do ato sexual no casamento” (p. 625).
4 A Godly Form of Househol Government [Schnucker, p. 302]
5 A Godly and Lesrned Exposition of Christ’s Sermon in the Mount [Schnucker, p. 360].
6 Tetrachordon [CPW, 2:608-9]

quinta-feira, 27 de março de 2014

A vida diária de um apóstolo de verdade - Por Augustus Nicodemus Lopes






As cartas que Paulo escreveu à igreja de Corinto são as de maior cunho pessoal e que mais revelam como era a vida daquele que é considerado o maior apóstolo do Cristianismo, data vênia Pedro e os papistas.

Como era a vida diária de Paulo, um apóstolo de Cristo?

- evitava batizar muita gente, para que não se formasse um fã clube em torno do seu nome (1Co 1:14-17);

- evitava a ostentação de linguagem na pregação pelo mesmo motivo e pregava somente a Cristo e este crucificado (1Co 2:1-5).

- a razão é que ele queria evitar que pessoas se agregassem à igreja impressionadas por seus talentos e carismas e não pela fé em Jesus Cristo (1Co 2:5).

- ficava lembrando seu rebanho de que ele era um mero servo, junto com outros, e que seu sucesso em ganhar pessoas para Cristo se devia tão somente à graça de Deus e não a méritos próprios (1Co 3:5-9).

- insistia que Deus requeria dos apóstolos somente que fossem fiéis, e não que fossem bem sucedidos, diante da tentação de muitos de compararem os ministérios dele, de Apolo e de Pedro (1Co 4:1-3).

- era constantemente considerado – inclusive por pessoas que faziam parte das próprias igrejas que havia fundado – como condenado a morte, espetáculo ao mundo e aos anjos, louco, fraco e desprezível (1Co 4:9-10).

- em diversas ocasiões passou fome, sede e nudez; foi esbofeteado e não tinha moradia certa ou casa própria (1Co 4:11)

- trabalhava até cansar com as próprias mãos para garantir o seu sustento (1Co 4:12).

- era perseguido, injuriado, caluniado e considerado o lixo do mundo, mas não respondia nem revidava a nenhuma destas provocações (1Co 4:13).

- muitos achavam que ele não tinha o direito de receber sustento da igreja e nem de se fazer acompanhar de uma esposa nos trabalhos missionários intensos e cansativos. Por isto, ele trabalhava para se sustentar e se recusava a receber salário, ofertas, dízimos e contribuições das igrejas, quando fazer isto pudesse lançar dúvida sobre suas intenções (1Co 9:1-12).

- pregava e evangelizava nas igrejas de graça, sem nada pedir e nada receber, para não colocar empecilho ao Evangelho de Cristo (1Co 9:15-18), pois seu alvo era ganhar o maior número possível de pessoas.

- preocupava-se em ser irrepreensível, em controlar-se e manter suas paixões e desejos debaixo de controle, para poder ter autoridade para pregar (1Co 9:25-27).

- enfrentou a morte várias vezes no trabalho missionário, e em algumas delas considerou que sua hora de morrer tinha finalmente chegado (2Co 1:8-9).

- passava por constantes sofrimentos e angústias de coração por causa das igrejas e dos crentes a quem amava e por quem se preocupava individualmente (2Co 2:4).

- perdoava e pedia o perdão dos outros para aqueles que o haviam ofendido e prejudicado o seu trabalho (2Co 2:7-8).

- quando era necessário mostrar as suas credenciais de apóstolo, apontava para as multidões convertidas pelo Evangelho da cruz que pregava com simplicidade e no poder do Espírito (2Co 3:1-4).

- tomava o maior cuidado para não adulterar a mensagem do Evangelho, não andava com astúcia e nem procurava enganar seus ouvintes para tirar proveito financeiro deles (2Co 4:1-2).

- vivia como um condenado à morte, levando em seu corpo o morrer de Jesus na forma de privações, perseguições, sofrimentos, calúnias e injúrias, como meio da vida de Cristo se manifestar através dele (2Co 4:7-15).

- sua esperança e expectativa não estavam aqui, nas riquezas, propriedades e bens, mas o tempo todo ele faz menção da glória celestial, das coisas invisíveis e eternas que ele aguardava como recompensa de seus sofrimentos e trabalho (2Co 4:16-18).

- quando precisava se recomendar aos ouvintes como ministro de Cristo incluía em seu currículo as muitas aflições, angústias, privações, açoites, prisões, tumultos, vigílias e jejuns no trabalho do Senhor (2Co 6:4-10).

- ainda nesta lista incluía os 39 açoites recebidos dos judeus pelo menos 5 vezes, ser fustigado com varas 3 vezes, 3 naufrágios, apedrejamentos, perigos de salteadores e assassinos, além do peso constante da responsabilidade das igrejas que pesava sobre seus ombros (2Co 11:29). 

- passou privações e teve de trabalhar arduamente para não ser pesado às igrejas onde receber oferta seria dar motivo para a acusação de mercenário (2Co 11:7-9).

- apresentava como motivo de gloria o fato de que uma vez teve que fugir de uma cidade escondido em um cesto e descido pelos irmãos pela muralha, para poder escapar com vida (2Co 11:30-33).

- lutava diariamente com um doloroso espinho na carne, que o abatia e fazia sofrer e clamar a Deus, mas sem resposta a não ser a provisão da graça para poder suportá-lo (2Co 12:7-10).

Muitos se consideram sucessores dos apóstolos, aqui e em Roma. É só comparar...

quarta-feira, 26 de março de 2014

Reclamaram que eu falei demais...


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Pois é... mais uma vez reclamaram que eu falei demais. Nesta segunda encontrei-me com o pastor da igreja em que preguei domingo à noite. Logo após o "boa noite" ele soltou: "O povo falou que você falou demais ontem! Parecia que sua pregação nunca ia acabar! O culto acabou às 21h. Nem em dia de Santa Ceia eu demoro tanto!".

Eu já estou meio acostumado a isso. Às vezes falo muito mesmo. Principalmente em se tratando de pregar a Palavra. Me acostumei a falar por 30, 40 e até por 50 minutos às vezes. Sei que isso incomoda bastante as pessoas. Principalmente neste contexto de imediatismo em que nós vivemos. Tudo é fast. Inclusive o culto.

Fico pensando como era a vida dos crentes Puritanos. Pregações de até 6 horas de duração. Se vivesse em nosso tempo, com certeza Spurgeon não seria o mais admirado dos pregadores. Fico pensando também em Paulo que pregou durante uma noite inteira e todos, exceto um tal de Êutico que dormiu e caiu da janela (ainda bem que ninguém senta nas janelas dos nossos templos), permaneceram firmes ouvindo a Palavra de Deus pregada por ele. E o que dizer de Jesus, que fazia suas preleções ao ar livre, sem equipamento de som, sem cadeiras acolchoadas e por horas, multidões maravilhavam-se de ouví-lo.

O mais curioso de tudo isso é que ninguém ainda veio a mim para reclamar do louvor. Nunca ouvi ninguém dizer:

"Puxa não aguento mais cantar 6 cânticos no louvor!"
"O louvor de nossa igreja está demorando muito! Precisamos conversar com o pastor!"
"Ai... uma hora de louvor é muito gente!!!!"

Se a musica que se canta nas igrejas brasileiras fosse pelo menos edificante, bíblica, até que passaria. O problema é que tudo que se canta é prosperidade e auto-ajuda. É claro que existem inúmeras exceções, mas no geral é assim mesmo. O que faz "sucesso" entre os ministérios de louvor é mesmo o reteté.

É claro que não posso me comparar a Spurgeon, Paulo e muito menos à Cristo. Sou um simples pregador do evangelho que se esforça por pregar a Palavra "viva e eficaz" que "corta mais que espada de dois gumes". E ainda sei que não sou um eximinio pregador. Mas o que percebo, e quero destacar aqui, é que o povo evangélico de hoje não suporta mais a sã doutrina.

Como dizia profeta Silvio Santos, "o povo gosta de pão e circo". É isso que o povo evangélico quer: Prosperidade e festa.

Fiquei muito triste ao ouvir o que ouvi. Principalmente porque veio da boca de quem deveria defender a supremacia das Escrituras e da pregação no culto.

Fico por aqui... e o que posso dizer, é que com a graça de Deus, ainda vou continuar ouvindo muitas pessoas reclamarem que eu falo demais.


Marcelo Batista Dias
Fonte: [ Ecclesia reformata sed semper reformanda ]
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terça-feira, 25 de março de 2014

Sobre os "Iluminados" de Hebreus 6

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O texto em foco diz:

É impossível, pois, que aqueles que uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se tornaram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro, e caíram, sim, é impossível outra vez renová-los para arrependimento, visto que, de novo, estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia. Porque a terra que absorve a chuva que frequentemente cai sobre ela e produz erva útil para aqueles por quem é também cultivada recebe bênção da parte de Deus; mas, se produz espinhos e abrolhos, é rejeitada e perto está da maldição; e o seu fim é ser queimada.” (Hebreus 6.4-8)

A primeira observação que deve ser feita a respeito de Hebreus 6.4-8, é que, trata-se, nos dizeres de Geerhardus Vos, de uma “difícil e importante passagem” sobre a aliança de Deus com o seu povo.[1] A razão dessa dificuldade está no fato de o autor da epístola mencionar especificamente o aspecto fenomenológico da religião nessa perícope.[2]

Os “iluminados” de Hebreus 6.4-8 eram pessoas que “abandonaram esta assembleia dos santos”.[3] Eram pessoas não-regeneradas, não-eleitas, incrédulas que durante algum tempo fizeram parte de uma igreja visível, mas que apostataram. Muito se questiona acerca de como pessoas ímpias puderam “provar” de vários benefícios, como por exemplo:

1) do dom celestial; 2) da participação comum do Espírito Santo; 3) da boa palavra de Deus; e 4) dos poderes do mundo vindouro. Como tais pessoas puderam desfrutar, em alguma medida, de bênçãos destinadas àqueles que foram os beneficiários diretos do sacrifício substitutivo de Cristo?

D. Mathewson, no seu artigo intitulado Reading Heb 6:4-6 in Light of the Old Testament, lança luz sobre esse questionamento, ao afirmar que, “a linguagem do autor em 6.4-6 é colorida por referências do AT que aludem e ecoam como citação direta”.[4] De forma específica, Mathewson sugere que a referência àqueles que foram “iluminados” lembra a coluna de fogo que alumiou os israelitas através do deserto.[5] Algumas passagens veterotestamentárias podem demonstrar o ponto. Neemias 9.12,19 diz o seguinte:

Guiaste-os, de dia, por uma coluna de nuvem e, de noite, por uma coluna de fogo, para lhes alumiar o caminho por onde haviam de ir [...] Todavia, tu, pela multidão das tuas misericórdias, não os deixaste no deserto. A coluna de nuvem nunca se apartou deles de dia, para os guiar pelo caminho, nem a coluna de fogo de noite, para lhes alumiar o caminho por onde haviam de ir.

“dom celestial” lembra o dom celestial do maná, que foi dado por Deus ao seu povo quando este se encontrava no deserto (Êxodo 16.15). Em Neemias 9.15 é dito que o pão celestial foi dado aos israelitas “na sua fome”. Por sua vez, a referência àqueles que “se tornaram participantes do Espírito Santo” ecoa a experiência dos peregrinos do deserto, que “tinham extensiva interação com o Espírito de Deus”[6], como é testemunhado em Neemias 9.20: “E lhes concedeste o teu bom Espírito, para os ensinar; não lhes negaste para a boca o teu maná; e água lhes deste na sua sede”.

Após considerar os elementos descritos em Hebreus 6.4-6, Mathewson conclui:“O autor não está apenas aludindo a textos fragmentados e a vocabulário isolado para apresentar uma retórica colorida, mas por aludir a textos que pertencem a uma enorme matriz de idéias ele está evocando o contexto inteiro e história da experiência de Israel no deserto”.[7]

Quando se leva em consideração que os destinatários dessa epístola eram cristãos judeus, essa interpretação se mostra bastante plausível. O autor de Hebreus utiliza a linguagem do Antigo Testamento para descrever um abandono doloroso de uma congregação por parte de algumas pessoas.

Dessa forma, a iluminação recebida, o dom celestial provado e o Espírito compartilhado se mostram bênçãos da graça comum de Deus destinada a pessoas ímpias ou, nas palavras de Charles Hodge, “influências do Espírito concedidas a todos os homens”.[8] Tais pessoas, “tiveram um claro entendimento do juízo de Deus sobre o mundo, das promessas de Deus, o desvendar do mundo futuro; tiveram uma clara distinção do juízo, bem como provaram dos milagres da era apostólica”, afirma o teólogo genebrino Matthew Poole.[9]

No seu comentário a respeito do versículo 4, João Calvino endossa a opinião de que mesmo os réprobos recebem algumas chispas da luz divina:

Mas aqui surge uma nova questão, como pode que aqueles que fizeram tal progresso venham a apostatar depois de tudo? Pois Deus, isso pode ser dito, não chama ninguém eficazmente a não ser os seus eleitos, e Paulo testifica que eles realmente são seus filhos e que são guiados por seu Espírito (Romanos 8.14) e ele nos ensina que, é um seguro penhor de adoção quando Cristo nos faz participantes do seu Espírito. O eleito também está além do perigo da apostasia final; pois o Pai que o elegeu para ser preservado em Cristo é maior do que tudo, e Cristo promete vigiar por eles de maneira que nenhum pereça. A tudo isso, eu respondo que Deus, de fato, favorece apenas os seus eleitos com o Espírito de regeneração e que, por isso eles são distinguidos dos réprobos; pois eles são renovados segundo a sua imagem e recebem a seriedade do Espírito na esperança da herança futura, e pelo mesmo Espírito o Evangelho é selado em seus corações. Mas eu não posso admitir que tudo isso seja alguma razão pela qual Ele não conceda também aos réprobos algum sabor da sua graça, que Ele não irradie suas mentes com algumas chispas da sua luz, ou não lhes dê alguma percepção da sua bondade, e de alguma maneira grave sua palavra em seus corações. De outra forma, o que viria a ser a fé temporal mencionada em Marcos 4.17? Portanto, existe algum conhecimento mesmo nos réprobos, o qual posteriormente vem a desvanecer, porque não possui raízes suficientemente profundas, ou porque elas murcham ao serem sufocadas.[10]

O que pode ser apreendido a partir desse comentário é que, de acordo com Calvino, bênçãos fluidas da obra expiatória de Cristo e destinadas diretamente aos eleitos e salvos como, por exemplo, a iluminação, o dom celestial da Palavra e a comunhão no Espírito, podem ser destinadas, ainda que de forma indireta a pessoas ímpias e incrédulas. Como Grudem acertadamente frisa, “a graça especial, que Deus dá aos salvos, leva a maior parte das bênçãos da graça comum aos incrédulos que vivem no campo de influência da igreja”.[11]

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Notas:

[1] Geerhardus Vos. The Teaching of the Epistle to the Hebrews. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1956. p. 28.
[2] Ibid.
[3] Moisés Bezerril. A Queda dos Iluminados de Hebreus 6.4-6. p. 16. Acessado em 18/08/2011.
[4] D. Mathewson. “Reading Heb 6:4-6 in Light of the Old Testament”, In: Westminster Theological Journal. Ed. 61. 1999. p. 214.
[5] Ibid. p. 216.
[6] Ibid. p. 217.
[7] Ibid. p. 223.
[8] Charles Hodge. Teologia Sistemática. São Paulo: Hagnos, 2001. p. 981.
[9] Matthew Poole. A Commentary on the Whole Bible: Matthew – Revelation. Vol. 3. Edinburgh: The Banner of Truth Trust, 2003. p. 737.
[10] John Calvin. Commentary on Hebrews. Grand Rapids, MI: Christian Classics Ethereal Library, 2000. p. 94. Acessado em 25/Ago/2011. 
[11] Wayne Grudem. Teologia Sistemática. p. 554.

Sobre o autor: Rev. Alan Rennê Alexandrino Lima é pastor efetivo da Igreja Presbiteriana do Cruzeiro do Anil, em São Luís-MA. 

segunda-feira, 24 de março de 2014

Calvinismo e Capitalismo - Por Alderi Souza de Matos



A questão de como se relacionam o calvinismo e o capitalismo tem sido objeto de enorme controvérsia, estando longe de produzir um consenso entre os estudiosos. O tema popularizou-se a partir do estudo do sociólogo alemão Max Weber (1864-1920) intitulado A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, publicado em 1904-1905. Numa tese oposta à de Karl Marx, Weber concluiu que a religião exerce uma profunda influência sobre a vida econômica. Mais especificamente, ele afirmou que a teologia e a ética do calvinismo foram fatores essenciais no desenvolvimento do capitalismo do norte da Europa e dos Estados Unidos.

Weber partiu da constatação de que em certos países da Europa um número desproporcional de protestantes estavam envolvidos com ocupações ligadas ao capital, à indústria e ao comércio. Além disso, algumas regiões de fé calvinista ou reformada estavam entre aquelas onde mais floresceu o capitalismo. Na sua pesquisa, ele baseou-se principalmente nos puritanos e em grupos influenciados por eles. Ao analisar os dados, Weber concluiu que entre os puritanos surgiu um "espírito capitalista" que fez do lucro e do ganho um dever. Ele argumenta que esse espírito resultou do sentido cristão de vocação dado pelos protestantes ao trabalho e do conceito de predestinação, tido como central na teologia calvinista. Isso gerou o individualismo e um novo tipo de ascetismo "no mundo" caracterizado por uma vida disciplinada, apego ao trabalho e valorização da poupança. Finalmente, a secularização do espírito protestante gerou a mentalidade burguesa e as realidades cruéis do mundo dos negócios.

Calvino de fato interessou-se vivamente por questões econômicas e existem elementos na sua teologia que certamente contribuíram para uma nova atitude em relação ao trabalho e aos bens materiais. A sua aceitação da posse de riquezas e da propriedade privada, a sua doutrina da vocação e a sua insistência no trabalho e na frugalidade foram alguns dos fatores que colaboraram para o eventual surgimento do capitalismo. Mesmo um crítico contundente da tese de Weber como André Biéler admite: "Calvino e o calvinismo de origem contribuíram, certamente, para tornar muito mais fáceis, no seio das populações reformadas, o desenvolvimento da vida econômica e o surto do capitalismo nascente" (O Pensamento Econômico e Social de Calvino, p. 661). Todavia, esse e outros autores têm ressaltado como a ética e a teologia do reformador divergem radicalmente dos excessos do capitalismo moderno. Por causa das difíceis realidades econômicas e sociais de Genebra, Calvino escreveu amplamente sobre o assunto. Ele condenou a usura e procurou limitar as taxas de juros, insistindo que os empréstimos aos pobres fossem isentos de qualquer encargo. Ele defendeu a justa remuneração dos trabalhadores e combateu a especulação financeira e a manipulação dos preços, principalmente de alimentos. Embora considerasse a prosperidade um sinal da bondade de Deus, ele valorizou a pessoa do pobre, considerando-o um instrumento de Deus para estimular os mais afortunados à prática da generosidade. A tese de que as riquezas são sinais de eleição e a pobreza é sinal de reprovação é uma caricatura da ética calvinista. Para Calvino, a propriedade, o lucro e o trabalho deviam ser utilizados para o bem comum e para o serviço ao próximo.

Em conclusão, existe uma relação entre o calvinismo e o capitalismo, mas não necessariamente uma relação de causa e efeito. Provavelmente, mesmo sem o calvinismo teria surgido alguma forma de capitalismo. Se é verdade que a teologia e a ética reformadas se adequavam às novas realidades econômicas e as estimularam, todavia, o tipo de calvinismo que mais contribuiu para fortalecer o capitalismo foi um calvinismo secularizado, que havia perdido de vista os seus princípios básicos. Entre esses princípios está a noção de que Deus é o Senhor de toda a vida, inclusive da atividade econômica, e, portanto, esta atividade deve refletir uma ética baseada na justiça, compaixão e solidariedade social.

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Extraído do site Thirdmill - acessado em 25 de Março de 2009.
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sexta-feira, 21 de março de 2014

Escolhidos Desde a Eternidade! - Por John MacArthur


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Efésios 1.3-14 é um hino de adoração proveniente do coração do apóstolo Paulo. Não é um argumento teológico monótono, e sim o transbordar de sentimentos ardentes do coração agradecido do apóstolo. No grego, esta passagem constitui uma grande sentença. O Espírito de Deus inspirou o apóstolo Paulo a proferir esta profusa adoração ao Deus que o havia salvado.
a. A passagem
“Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo, assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado, no qual temos a redenção, pelo seu sangue, a remissão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça, que Deus derramou abundantemente sobre nós em toda a sabedoria e prudência, desvendando-nos o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito que propusera em Cristo, de fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisas, tanto as do céu como as da terra; nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade, a fim de sermos para louvor da sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo; em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa; o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória.”
b. As pessoas
1. O Pai
Governando estes versículos, encontra-se a idéia de que Deus realizou a salvação por sua própria vontade, propósito e desígnio. A salvação não resulta da vontade ou do mérito de uma pessoa. A salvação não é obtida por meio de sacrifícios religiosos ou de boas intenções. O crédito da salvação pertence apenas a Deus, e somente Ele pode ser louvado e glorificado.
2. O Filho
A salvação é a obra de Deus mediada por Cristo. A salvação tanto se realiza em Cristo como por meio dEle . A salvação se encontra no Amado, que é Cristo. Foi proposta nEle. Enquanto a salvação é uma obra exclusiva do Pai, ela se realiza por intermédio de Cristo.
3. O Espírito
A salvação é selada pelo Espírito Santo (v. 13). Ele é o Espírito Santo da promessa, que nos foi dado como penhor de nossa herança — a garantia de nossa completa e futura redenção como propriedade de Deus mesmo. Deus, o Pai, Deus, o Filho, e Deus, o Espírito Santo, recebem todo o crédito da salvação.
Ensinos
I. Deus nos escolheu
Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo, assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele.”
a. A afirmação do apóstolo
Paulo inicia esta passagem afirmando que Deus recebe todo o louvor na salvação. O verbo traduzido “escolheu” (no grego, eklegomai) foi empregado na forma reflexiva, significando “selecionar para si mesmo”. Isso significa que a ação do verbo retorna à pessoa que a pratica. Paulo estava dizendo que Deus nos escolheu tendo em vista o seu próprio interesse — para Si mesmo, pessoalmente. A escolha divina foi realizada antes que o mundo existisse.
b. A confirmação das Escrituras
A Bíblia afirma a verdade da escolha redentora feita por Deus.
1) Mateus 25.34 - Jesus disse: “Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo”. O Senhor planejou tanto o reino quanto os habitantes do reino, antes que o mundo começasse a existir. Você e eu somos salvos e conhecemos o Senhor Jesus por que Deus nos escolheu.
2) Lucas 12.32 - Jesus disse a seus discípulos: “Não temais, ó pequenino rebanho, porque vosso Pai se agradou em dar-vos o seu reino”.
3) João 6.44 - Jesus proclamou para uma grande multidão: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, não o trouxer [compelir]”.
4) João 15.16 - Jesus disse a seus discípulos: “Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e deis fruto”. Nós não escolhemos a Jesus; Ele nos escolheu. Não decidimos por Cristo no mais verdadeiro sentido — Ele decidiu por nós.
5) Atos 9.15 - O Senhor disse a respeito do apóstolo Paulo: “Este é para mim um instrumento escolhido”.
A conversão de Paulo aconteceu abruptamente — ele estava a caminho de Damasco para perseguir os crentes. Mas ele foi convertido, transformado e chamado para ser um apóstolo, porque Deus o escolhera antes da fundação do mundo.
6) Atos 13.48 - afirma sobre aquelas pessoas que ouviram a pregação de Paulo e Barnabé: “Creram todos os que haviam sido destinados para a vida eterna”. Deus outorga o dom da fé somente para aqueles que estão predestinados por meio da escolha dEle mesmo.
7) 2 Tessalonicenses 2.13 - “Devemos sempre dar graças a Deus por vós, irmãos amados pelo Senhor, porque Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação”. Paulo não deu graças porque os crentes de Tessalônica haviam decidido se tornar pessoas salvas. Eles não eram muitíssimo inteligentes, espertos, espirituais, perspicazes e, por isso, escolheram a Deus; pelo contrário, Deus os escolheu desde o princípio. A salvação exige que tenhamos fé, mas a fé é o resultado da escolha de Deus.
8) 2 Timóteo 1.8,9 - “Deus... nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos”.
9) 1 Pedro 1.2 - afirma que os crentes são “eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo”.
10) Apocalipse 13.8; 20.15 - infere que os nomes dos
crentes foram escritos no Livro da Vida do Cordeiro antes da fundação do mundo.
c. A confirmação da teologia
Somente Deus pode receber o crédito por nossa salvação. A doutrina da eleição é a mais humilhante de todas as doutrinas ensinadas nas Escrituras. Deus escolheu um povo para torná-lo santo, a fim de que estejam com Ele para sempre. A nossa fé vem de Deus. Um poeta anônimo apresentou esta verdade nas seguintes palavras do hino Vida Interior: “Eu procurava o Senhor e descobri que Ele, buscando-me, inclinou minha alma a procurá-Lo. Não fui eu quem Te encontrou, ó verdadeiro Salvador; não, eu fui encontrado por Ti”.
II. Deus nos predestinou (v. 5)
“Em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade.”
a. A afirmação do apóstolo
Por meio da escolha divina previamente determinada, fomos predestinados para a adoção como filhos de Deus. Realmente somos filhos de Deus.
b. A confirmação das Escrituras
1) João 1.12 - “A todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus”.
2) Romanos 8.15 - “Recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba, Pai”.
3) Gálatas 3.26 - “Todos vós sois filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus”.
4) Gálatas 4.6-7 - “Porque vós sois filhos, enviou Deus ao nosso coração o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai! De sorte que já não és escravo, porém filho; e, sendo filho, também herdeiro por Deus”.
5) 1 João 3.1 - “Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados filhos de Deus”.
c. A confirmação da teologia
A escolha predeterminada de Deus não dependeu do que Ele viu em nós. Ele a fez “segundo o beneplácito de sua vontade” (v.5). Deus não nos escolheu porque Ele tinha de fazer isso, e sim porque Ele quis — trouxe-Lhe prazer. Deus mesmo disse: “O meu conselho permanecerá de pé, farei toda a minha vontade” (Is 46.10).
III. Deus nos concedeu sua graça (v. 6)
“Para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado.”
a. A afirmação do apóstolo
A escolha de Deus e a nossa predestinação se tornaram uma realidade em nossas vidas por intermédio da graça de Deus. Graça significa favor imerecido, bênção pela qual não trabalhamos, bondade não resultante de méritos. Somos salvos pela graça de Deus.
b. A confirmação das Escrituras
1) Efésios 2.8-9 - “Pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie”. A graça de Deus não admite qualquer mérito da parte do homem.
2) Atos 15.11 - “Cremos que fomos salvos pela graça do Senhor Jesus”.
3) Atos 18.27 - “Tendo [Apolo] chegado, auxiliou muito aqueles que, mediante a graça, haviam crido”.
4) Romanos 3.24 - Somos “justificados gratuitamente, por sua graça”.
c. A confirmação da teologia
A expressão, no versículo 6, pode ser traduzida literalmente por “mediante a graça temos sido agraciados”. Deus nos concedeu graça em Cristo, o Amado, trazendo à realidade a sua escolha e predestinação por nos tornar seus filhos.
IV. Deus nos redimiu (v. 7a)
“No qual temos a redenção, pelo seu sangue.”
a. A afirmação do apóstolo Paulo
1) Do que Deus nos redimiu?
Deus nos resgatou da escravidão ao pecado, à morte, ao inferno, a Satanás, aos demônios, à carne pecaminosa e ao mundo. Não tendo qualquer dignidade e esperança, com nossa mente em trevas e coração inclinado para o mal, éramos escravos miseráveis; apesar disso, Deus veio ao nosso encontro e nos comprou da escravidão. Fomos comprados porque fomos predestinados; predestinados, porque fomos escolhidos; escolhidos, porque fomos amados; e amados, porque o beneplácito de Deus assim o quis.
2) Por meio do quê?
Romanos 6.23 declara: “O salário do pecado é a morte”. Cristo nos redimiu por meio do derramamento de seu sangue. Esse não foi um preço fácil de ser pago. Ele teve de assumir a forma humana, vir ao mundo e morrer na cruz, vertendo seu sangue em sacrifício por nós. O sangue de Cristo é realmente precioso.
b. A confirmação das Escrituras
1) 1 Pedro 1.18-19 - “Não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo”.
2) Apocalipse 5.9 - diz a respeito de Cristo: “Digno és de tomar o livro e de abrir-lhe os selos, porque foste morto e com o teu sangue compraste para Deus os que procedem de toda tribo, língua, povo e nação”.
V. Deus nos perdoou (v. 7b, 8a)
“A remissão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça, que Deus derramou abundantemente sobre nós.”
a. A afirmação do apóstolo
Deus não somente nos resgatou, mas também perdoou os nossos pecados — passados, presentes e futuros.
b. A confirmação das Escrituras
1) Mateus 26.28 - Jesus disse: “Isto é o meu sangue, o sangue da [nova] aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de pecados”. Quando Deus perdoa (no grego, aphiemi, “mandar embora para nunca mais retornar”), Ele remove os nossos pecados para tão distante quanto o Oriente está do Ocidente (Sl 103.12), lança-os nas profundezas do mar (Mq 7.19) e nunca mais se lembra deles (Is 43.25).
2) Miquéias 7.18 - “Quem, ó Deus, é semelhante a ti, que perdoas a iniqüidade e te esqueces da transgressão do restante da tua herança?”
3) Romanos 8.1 - “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”.
4) Efésios 4.32 - “Sede uns para com os outros benignos, compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus, em Cristo, vos perdoou”.
5) Colossenses 2.13 - “E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos”.
6) 1 João 2.12 - O apóstolo João disse: “Filhinhos, eu vos escrevo, porque os vossos pecados são perdoados, por causa do seu nome”.
c. A confirmação da teologia
O perdão de Deus foi derramado abundantemente sobre nós por meio das riquezas de sua graça. O perdão exigiu abundância de graça porque tínhamos muitos pecados. A parábola do credor incompassivo (Mt 18.21-35) afirma que temos uma dívida impagável e indescritível. Devemos nossa salvação ao Deus que desejou nos ter como sua propriedade peculiar. Somos perdoados independentemente de nossa indignidade.
VI. Deus nos iluminou (vv. 8b-10)
“Em toda a sabedoria e prudência, desvendando-nos o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito que propusera em Cristo, de fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisas, tanto as do céu como as da terra.”
a. A afirmação do apóstolo
Quando somos salvos, somos também iluminados. Deus nos apresenta um retrato de como todas as coisas, do céu e da terra, serão colocadas em sujeição a Cristo, para o seu louvor. Ele nos iluminou com
sabedoria nas coisas eternas e com prudência nas coisas terrenas.
b. A confirmação das Escrituras
1) 1 Coríntios 2. 12 - “Não temos recebido o espírito do mundo, e sim o Espírito que vem de Deus, para que conheçamos o que por Deus nos foi dado gratuitamente”.
2) 1 Coríntios 2.16 - “Quem conheceu a mente do Senhor, que o possa instruir? Nós, porém, temos a mente de Cristo”.
3) 2 Coríntios 4.3-4 - “Se o nosso evangelho ainda está encoberto, é para os que se perdem que está encoberto, nos quais o deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a imagem de Deus”.
4) 1 João 2.27 - “A unção que dele recebestes permanece em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine”.
c. A confirmação da teologia
Deus nos iluminou porque Ele mesmo o quis. Se não fosse por causa de seu beneplácito, permanece-ríamos nas trevas, incapazes de participar do seu plano.
VII. Deus nos prometeu (vv. 11-12)
“Nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade, a fim de sermos para louvor da sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo.”
a. A afirmação do apóstolo
Deus nos predestinou para sermos seus filhos, e seus filhos receberão a herança dEle.
b. A confirmação das Escrituras
1) Romanos 8.18 - “Os sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós”.
2) 1 João 3.2 - “Ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é”.
3) 1 Pedro 1.4 - O apóstolo Pedro afirmou que temos “uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos céus”.
4) 2 Coríntios 1.20 - “Porque quantas são as promessas de Deus, tantas têm nele o sim”.
c. A confirmação da teologia
Todas as promessas de Deus — paz, amor, sabedoria, vida eterna, alegria e vitória — são nossas de acordo com a promessa de Deus. Elas nos foram asseguradas não por direito, e sim pela graça de Deus. Ele recebe toda a glória.
VIII. Deus nos selou (vv. 13-14)
“Em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa; o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória.”
a. A afirmação do apóstolo
Ele declarou que nossa herança está assegurada porque Deus nos selou.
b. A confirmação da teologia
Selar, nos tempos antigos, era um sinal de possessão, segurança, autenticidade e término de uma transação. A habitação do Espírito Santo nos crentes significa que eles são possuídos, seguros, autenticados e completos por Deus. Esperamos pela redenção completa e somos habitados pelo Espírito como um selo e garantia da nossa herança (Rm 8.23-24).
Conclusão
Somente Deus merece o crédito por nossa salvação. Ele nos salva por sua própria e espontânea vontade; todavia, de nosso ponto de vista, precisamos fazer duas coisas: a) esperar em Cristo (v. 12); b) crer nEle (v. 13). Isso também acontece para o louvor e glória de Deus mesmo (v. 12). Ele nos dá o poder para esperarmos em Cristo. Nossa fé vem de Deus (Ef 2.8-9). Ele abre nossos ouvidos para atendermos à mensagem da verdade e nos capacita a crer. Todo o processo de salvação é realizado pelo Espírito Santo; sem Ele, ninguém poderia esperar ou crer em Cristo.
Jesus disse que todos os que não crêem no Filho de Deus estão condenados (Jo 3.18). Deus, em sua graça soberana, decidiu salvar aqueles que Ele mesmo amou (Rm 9.8-13). Tais pessoas são resgatadas da correnteza de homens e mulheres sem esperança que flui em direção ao inferno. Essa é uma verdade humilhante e deve resultar em imensa gratidão de nossa parte. Por que Deus nos escolheu e não outras pessoas? Ele não o fez porque merecíamos a salvação, e sim para demonstrar “as riquezas da sua glória” (Rm 9.14-23). Portanto, nossa única reação tem de ser: “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo” (Ef 1.3).
Ponderando os princípios
1) A nossa época proclama altissonantemente a auto-importância do homem. Os comerciais nos dizem que merecemos uma folga, um carro melhor, comida melhor, roupas melhores — merecemos mais da “boa vida”. Os problemas da humanidade freqüentemente são diagnosticados como falta de auto-estima. No entanto, a Bíblia diz que “todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer” (Rm 3.12). Ao invés de afirmar a boa estimativa que o homem faz de si mesmo, as Escrituras colocam as seguintes palavras na boca dos que têm discernimento: “Todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças, como trapo da imundícia; todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniqüidades, como um vento, nos arrebatam” (Is 64.6). Para que Deus seja corretamente honrado e glorificado, todo crente tem de compreender que a salvação é uma obra exclusiva da graça divina.
2) A obra de Deus na salvação tanto reflete a natureza de Deus quanto a natureza do homem. Quando o apóstolo João escreveu: “Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados filhos de Deus” (1 Jo 3.1), ele estava fazendo um comentário sobre o grande amor de Deus e sobre a corrupção do homem. Thomas Watson escreveu: “Para que você seja uma pessoa agradecida, Deus o chamou exatamente quando você O ofendia; Ele o chamou sem precisar de você e mesmo tendo milhares de santos glorificados e de anjos a adorá-Lo. Pense naquilo que você era antes de ter sido chamado por Deus” (A Body of Divinity). A doutrina da eleição soberana, entendida corretamente, produz gratidão profunda para com Deus nos corações dos crentes.
De que maneira isso tem afetado a sua vida?
Fonte: Grace to youVia: Editora Fiel

terça-feira, 18 de março de 2014

A fé cristã é compatível com o socialismo marxista? - Por Johannes G. Vos


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Pergunta 140. Qual é o oitavo mandamento?
R: O oitavo mandamento é: não furtarás.
Pergunta 141: Quais são os deveres exigidos no oitavo mandamento?
R: Os deveres exigidos no oitavo mandamento são a verdade, a fidelidade e a justiça nos contratos e no comércio entre os homens; dar a cada um aquilo que lhe é devido; restitui aos donos legítimos os bens tirados deles ilicitamente; dar e emprestar gratuitamente, conforme nossos recursos e as necessidades dos outros; moderar os nossos juízos, desejos e sentimentos relativos aos bens mundanos; o cuidado e a busca providente para obter, guardar, usar e dispor das coisas necessárias e convenientes à sustentação da nossa natureza e apropriadas á nossa condição; ter um meio de vida lícito e empenhar-se nele; a frugalidade; evitar processos judiciais, fianças ou outras demandas semelhantes; e o esforço, por todos os meios justos e lícitos, de procurar, preservar e aumentar a riqueza e o estado exterior, tanto de outros quanto o nosso próprio.
Comentário:
1. Qual é o alcance geral do oitavo mandamento?
O alcance geral do oitavo mandamento é o respeito à santidade da propriedade, da mesma sorte que o sexto impõe respeito á santidade da vida e o sétimo, à santidade do sexo. A propriedade ou a riqueza é criada por Deus e confiada ao homem para o seu uso na glorificação e no serviço a Deus. É, portanto, um compromisso administrativo atribuído ao homem e por isso tem de ser respeitado. O oitavo mandamento, portanto, requer não apenas que nos guardemos de roubar o bem do nosso próximo, mas que conquistemos e conservemos o nosso.
2. A Bíblia autoriza a propriedade privada?
Sim. A posse da propriedade privada, no estado pecaminoso em que a humanidade existe desde a queda, é necessária para que uma vida possa glorificar e gozar a Deus. A propriedade privada fundamenta-se não na mera invenção ou costume humanos, mas na lei moral de Deus. Está definitivamente autorizada pelo oitavo mandamento – “Não furtarás” – o qual só fará sentido se houver por trás dele uma ordenação divina para a propriedade privada. Mesmo fora da Bíblia, a revelação natural ensina a todos os homens que roubar é errado. Está profundamente equivocado quem hoje pensar que a propriedade privada é maligna. Os males que ele tem em mente procedem não da propriedade privada em si mesma, mas dos abusos da propriedade privada.
3. À luz da Bíblia, que devemos pensar do comunismo?
Segundo o que a Bíblia ensina, o comunismo é errado a princípio. Não é errado meramente em alguns de seus aspectos ou práticas, ou por causa dos abusos a ele associados, mas é errado e maligno na sua ideia fundamental. Se pudéssemos imaginar um “perfeito” estado de comunismo, em que não houvesse tirania, campos de concentração, policia secreta, propaganda politica, nem censura de informações, ele ainda seria inerentemente pecaminoso e maligno. O capitalismo viola a lei moral de Deus pelos males e abusos a ele vinculados; o comunismo viola a lei moral de Deus por sua própria natureza e ideia fundamental. O principio do comunismo é a posse coletiva da propriedade imposta pelo Estado. Isso pressupõe que a posse particular do indivíduo é um mal que só pode ser tolerado em pequena escala, como uma concessão à natureza humana. Isso é contrário à Bíblia, que ensina que a propriedade privada é um direito dado por Deus. O ser humano individual, como portador da imagem de Deus, deve ter o direito à propriedade conforme o propósito de Deus e para O glorificar plenamente na sua relação com o seu ambiente. A imagem de Deus no homem abrange a implicação de que o homem deve ter o domínio sobre a Terra (Gn 1.27-28); mas o homem é essencialmente um indivíduo, com alma e consciência individuais, com competência e habilidades individuais, com esperança e desejos individuais. O comunismo procura fundir o indivíduo à massa da humanidade e isso envolve o sacrifício do elemento essencial da personalidade do homem, como portador individual da imagem divina e mordomo de Deus com domínio sobre uma parcela da criação de Deus. O comunismo assume que o indivíduo existe por causa da massa, da sociedade, mas isso é contrário a Palavra de Deus, a qual nos ensina que a sociedade e todas as instituições sociais existem por causa do indivíduo, para que ele possa alcançar o propósito divino da sua vida e assim glorificar a Deus. É o indivíduo quem possui uma alma mortal, uma consciência e a capacidade para a comunhão com Deus. Essas coisas sobreviverão a esse mundo e existem para sempre. Elas é que dão dignidade e valor reais à vida humana. Qualquer sistema que considere o ser humano individual como sem importância e busca amalgamá-lo á massa supostamente pelo bem-estar da “sociedade” é fundamentalmente errado e anticristão. Isso se aplica tanto à propriedade coletiva compulsória quanto às outras subversões da individualidade da personalidade humana.
4. Segundo registra Atos (2.44; 4.32-27), a igreja primitiva não praticava o comunismo?
É verdade que existia um tipo de “comunismo” na igreja de Jerusalém, mas era totalmente diferente do comunismo que existe hoje. Deve-se observar que (a) era voluntária e não compulsória, como mostram as palavras de Palavras de Pedro a Ananias em Atos 5.4; 9 (b) era parcial e não total, como demonstra o fato de que a casa de Maria, mãe de João Marcos, não fora vendida; (c) logo surgiu uma murmuração acusatória de que as rações de comida não estavam sendo distribuídas de modo justo (At 6.1); (d) isso foi apenas temporário, sendo descontinuado mais tarde, provavelmente no tempo de grande perseguição que se seguiu ao martírio de Estevão, quando os crentes se espalharam a partir de Jerusalém (At 8.1-4); (e) não há menor indicação de que tenha sido implantado algum “comunismo” assim em nenhuma das Igrejas estabelecidas pelos apóstolos, além da igreja em Jerusalém. É claro, portanto, que o “comunismo” temporário da Igreja de Jerusalém não era uma questão de princípios, mas de contingência em face das condições peculiares àquele tempo e lugar. É extremamente insensato, antibíblico e anti-histórico apresentar o estado temporário das ocorrências na Igreja de Jerusalém como análogo ao comunismo moderno, ou como um padrão a ser imitado pelos crentes em Cristo de todos os lugares.
5. O socialismo é contrário ao cristianismo?
A palavra socialismo é usada com uma variedade tão grande de sentidos que é difícil falar categoricamente dela sem primeiro a definir, para sabermos precisamente o que quer dizer. O socialismo marxista, que é raiz do comunismo moderno, é indubitavelmente contrário à religião cristã. Embora haja uma forma limitada de socialismo que não é contrária ao ensinamento da Palavra de Deus. O governo operar serviço postal, em vez de deixa-lo à iniciativa de particulares ou de corporações, é uma forma de socialismo; mas não se pode achar que seja pecaminoso o envolvimento do Estado nesse empreendimento. Na maioria dos países do mundo as ferrovias, os serviços telefônicos e os de comunicação são operados ou majoritariamente ou exclusivamente pelo Estado. Podemos, ou não, achar que isso seja inteligente, mas dificilmente conseguiremos provar que seja contrário à Bíblia; assim mesmo faz-se necessário traçar um limite em algum ponto. Seria errado, com certeza, que o Estado controlasse e operasse todos os negócios e comércios. A operação de negócios pelo Estado deveria limitar-se a atividades como as do serviço postal, que são essenciais para todos os habitantes do país e por questão de economia requerem monopólio de alcance nacional. O Estado deve proporcionar as condições para que os negócios privados sigam adiante, e deve regulamentá-lo em prol da justiça, mas não deve suplantá-lo competindo contra ele. Deus instituiu o governo civil para promover o bem das pessoas pela manutenção da justiça na sociedade humana (Rm 13.4), e não para se firmar como um colossal empreendimento coletivo em concorrência com os seus próprios cidadãos.
***Extraído de: Johannes G. Vos, Catecismo Maior de Westminster Comentado (São Paulo, Editora Os Puritanos, 2007), pp. 433-437.Adquira o livro no site da CLIREO livro também pode ser adquirido em formato Kindle aqui!
Fonte: Estudantes de Teologia